<p>A avó materna, galega e católica da cabeça aos pés, queria que fosse padre. Ele queria emigrar. Para os Estados Unidos. No fim, nem uma coisa, nem outra. O pai, bancário, começaria a ganhar melhor e Maximino Cunha haveria de rumar de Chaves para Coimbra e, depois, para Lisboa. E assim se faria médico. E comunista. </p>
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A opção política condicionou--lhe a progressão na carreira. "Antes do 25 de Abril, nunca pude aceder a nenhum lugar do Estado", recorda. Mas haveria também de marcar a forma de exercer a profissão. Já doutor, regressou a Chaves por castigo (político). "Julgo que não sabiam que me estavam a mandar para a minha terra natal".
Nessa altura, depois do serviço clínico no quartel, Maximino Cunha exercia Medicina privada. Muitas vezes sem cobrar. "Sabia perfeitamente que não tinham dinheiro para me pagar. Ah, quantas vezes!", lembra. E justifica: "Se não fosse sensível à pobreza não seria comunista". Hoje, garante que este tipo de casos são cada vez mais raros, mas teme que a crise os possa fazer renascer. "Provavelmente vão aparecer por causa do desemprego e da crise ".
O consultório, em casa, não está identificado. "A publicidade são os doentes que a fazem". Não tem computador. Olha para os doentes. A tabela de preços, no corredor, está em euros e escudos. 40 (8 contos) na primeira consulta e 30 na segunda e seguintes. João Semana puro, talvez não, mas com uma costela, certamente.
José Moreno, de 58 anos, médico há 30, fez a maior parte da sua carreira no Serviço Nacional de Saúde em Bragança. Desde cedo enveredou pelo trabalho de voluntariado em associações culturais, desportivas e recreativas. É uma vertente João Semana, "mas dos tempos modernos", ressalva.
O trabalho de voluntariado é intenso, acorre a quem o solicita, "na medida da minha disponibilidade". Há 27 anos que é médico da Associação Humanitária dos Bombeiros de Bragança. Mas também trabalha com o Grupo Desportivo de Bragança há quase 30 anos; com a equipa de hóquei do Clube Académico; com a Cruz Vermelha, de que é co-fundador; e com outras associações desportivas do distrito. Parte da sua actividade na Santa Casa da Misericórdia, onde faz consultas há 11 anos, também é "pro bono".
Mal terminou o curso de Medicina, interessou-se pelo trabalho de voluntário, pela satisfação interior que lhe dá. "Gosto de trabalhar com gente que sabe ser grata por gestos e por sinais de carinho. Tudo quanto se faz aos idosos é reconhecido", contou.
Sabe de cor os nomes das "largas" centenas de utentes do seu ficheiro: "É das coisas que as pessoas, sobretudos os idosos, mais gostam, não são um simples número". Mesmo no Centro de Saúde, quase todos os dias vê mais utentes do que está estipulado: quando tem 12 marcações, atende 30. "Sou incapaz de recusar um doente que veio de tão longe e apesar de nem ter consulta marcada".
Paulo Jaleco foi para o Alentejo com cinco anos. Passados 42 anos, diz-se nascido em Évora e que a sua profissão de médico-cirurgião lhe permite "continuar a praticar a solidariedade no desporto". Râguebi, andebol, futebol, ciclismo, karaté e atletismo fazem parte do seu currículo benemérito, a que se junta a ajuda aos Bombeiros Voluntários de Évora.
Jaleco diz que o facto de, desde muito jovem, ter praticado râguebi, lhe deu "uma visão diferente da vida". Foi fundador, presidente, treinador, jogador e médico do Clube de Râguebi de Évora, onde iniciou um périplo por vários clubes da região. De forma gratuita.
Mas o futebol e o clube do seu coração, Juventude de Évora, também têm merecido atenção. Agora, com menos assiduidade, Jaleco continua a dar apoio ao clube. Sempre gratuitamente. Quando esteve no Hospital de Serpa, também o clube da aldeia de Pias "beneficiou" dos seus serviços.
Entretanto, interessou-se pelo ciclismo e pela Volta ao Alentejo, onde se mantém há 13 anos. Foi o médico oficial das provas organizadas pelo JN, substituindo os históricos Barreiros de Magalhães.
Aos 82 anos, Manuel Cipriano Leal, ou apenas dr. Leal, como é conhecido na região de Fafe, continua sentado no consultório, de porta aberta, para atender a todos. A genica já não é a de outros tempos, mas a vontade de ajudar o próximo mantém-se vigorosa. "Sinto-me bem assim, é da minha natureza", deixa escapar entre um chorrilho de recordações.
Dos montes e vales da região que circunda a cidade de Fafe, o dr. Leal lembra os dias a fio em que percorreu, muitas vezes a pé, os lugares de onde recebia o chamado. "Às vezes chegava a casa de madrugada e tinha logo de sair. O telefone não parava", contou. Ainda hoje não nega uma chamada. "Seja de onde for". E sempre com o espírito solidário que o acompanha desde o berço, em Santarém.
Ligado às conferências de S. Vicente de Paulo, o dr. Leal cedo se apercebeu das necessidades da população. "Entrava numa casa e avaliava logo a condição das pessoas. É da minha formação. Muitas vezes levava a medicação para os primeiros dias e deixava-a ficar". Em fim de carreira, mantém esse orgulho em auxiliar o próximo e, após 50 anos de exercício, conhece bem quem o procura. "Ajudo, mas não sou daqueles que vou cobrar mais a um que pode só porque não cobrei a outro que não podia", explicou.
Apesar da idade, diariamente está no consultório e os fafenses sabem que têm no dr. Leal alguém disposto a ajudar desinteressadamente por uma boa saúde.