Aconvicção, no "núcleo duro" do Governo, de que o ex-director da Polícia Judiciária poderá ter protagonizado fugas de informação selectivas e contribuído para a eventual violação do segredo de justiça no processo Casa Pia, envolvendo o nome do então líder da Oposição, Ferro Rodrigues, pesou de modo decisivo na opção de fazer sentir a Adelino Salvado a falta de apoio político do Executivo e, assim, forçar a sua demissão.
Segundo foi possível apurar, no seio do Governo terá sido admitida a autenticidade de excertos de conversas mantidas - e, ao que tudo indica, ilicitamente gravadas - entre Adelino Salvado e um jornalista do "Correio da Manhã". A confirmar-se a autenticidade, o ex-director da PJ teria utilizado, com vista à sua difusão pública, elementos de informação alegadamente constantes do processo - mas que não estariam no inquérito, nem foram acolhidos pela acusação -, envolvendo o então secretário-geral do Partido Socialista no escândalo da Casa Pia.
A suspeita de que se poderia estar perante um caso de manipulação de informação sob segredo de justiça, com óbvias implicações políticas - recorde-se que vários dirigentes socialistas se queixaram publicamente de estarem a ser alvo de uma "cabala" - terá sido o principal motivo a precipitar a saída do director da PJ. Até porque, segundo garantiram ao JN várias fontes, as gravações das conversas em causa, que Adelino Salvado sugeriu poderem ter sido "truncadas", se encontravam já na posse de diversos dirigentes políticos da maioria governamental e do PS, pelo menos uma semana antes do caso ter vindo a público.
Ferro quer culpados
Contactado pelo JN, Ferro Rodrigues reagiu com violência: "Não conheço as cassetes, mas se é verdade que os conteúdos me referem, conforme já muitos me disseram, então a demissão de Adelino Salvado não me chega. Tem de pagar pelo que fez".
"Quero saber tudo o que se passa à volta desta história das cassetes", afirmou o dirigente socialista, acrescentando: "Se é verdade que existe uma conversa entre Adelino Salvado e Octávio Lopes, do "Correio da Manhã", onde falam várias vezes de mim, então esse juiz cometeu três crimes: violação grosseira do segredo de justiça, divulgação de calúnias e a mais abjecta conduta de destruição de um líder político. Enquanto não souber quem montou e me envolveu na miserável trama da Casa Pia não descansarei".
Para o ex-líder da Oposição é também irrelevante saber a validade penal das gravações. "A perspectiva jurídica não me interessa. É importante para os tribunais saberem se aquilo tem ou não valor jurídico, mas para mim não é o mais importante. Trata-se da minha vida, da minha dignidade. E o próprio comunicado do procurador-geral também diz isso. Que serão averiguados todos os comportamentos. É isso que eu exigo".
Ferro Rodrigues recorda ainda o momento em que foram divulgadas conversas privadas entre si e António Costa, designadamente comentários irrelevantes para o processo, mas "mortais" para a sua carreira política: "Quando divulgaram conversas truncadas entre mim e outros responsáveis do PS também houve a mais abjecta violação do segredo de justiça. Ninguém defendeu o combate a essa ilicitude. É muito estranho que agora se insurjam contra a divulgação destes conteúdos. Eu já disse que este era o combate da minha vida e não desistirei dele. Quero que tudo fique completamente esclarecido".
* com Fátima Mariano
