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Ludwik Idzikowski morreu de forma trágica, nos Açores, em 1929, incinerado pelo povo. A homenagem do Executivo polaco e português ao piloto natural de Varsóvia está na origem, agora, de um "incidente" protocolar entre o Governo Regional e o da República.
O aviador polaco Ludwik Idzikowski morreu em 1929, na ilha Graciosa, nos Açores, na segunda tentativa falhada de atravessar o Atlântico de avião. Pioneiro da aviação civil, o militar polaco foi homenageado, quarta-feira, junto ao local onde morreu.
A homenagem, que contou com a presença do ministro dos Combatentes e Vítimas da Repressão da Polónia, Jan Ciechanowski, e da secretária de Estado Adjunta e da Defesa Nacional, Berta Cabral, está na origem de um protesto do Governo Regional.
"Foi um lapso protocolar que já lamentei junto do senhor presidente do Governo Regional", justificou, esta quinta-feira, o ministro da Presidência, Luís Marques Guedes, que falava na conferência de imprensa realizada no final da reunião semanal do Conselho de Ministros.
É a resposta, oficial, ao protesto, por carta divulgada nas notícias, em que presidente do Governo Regional dos Açores, Vasco Cordeiro, transmitiu o veemente protesto" pelo facto de ter tido conhecimento apenas pela comunicação social da visita oficial do ministro polaco para homenagear Ludwik Idzikowski, pioneiro polaco da aviação civil, que morreu em missão patriótica.
Pelos ares, pela pátria...
Nascido em Varsóvia, na Polónia, a 24 de agosto de 1891, Ludwik fica para a história como um dos pioneiros das tentativas de cruzar o Oceano Atlântico de avião. Tentou duas vezes. Falhou à primeira, e morreu a tentar, na segunda.
Com fama de ser um excelente piloto, Idzikowski era uma das figuras mais conhecidas da aviação europeia. Em 1926, foi escolhido para chefiar, em França, os testes a um avião de longo curso comprado pela Polónia, que procurava a legitimação internacional como estado soberano.
Em 1928, o governo polaco mandou preparar o avião testado por Ludwik, um bombardeiro Amiot 123, e autorizou a travessia do Atlântico, entre Paris e Nova Iorque.
A aventura começou às 4.45 horas de 3 de agosto de 1928. Com Ludwik aos comandos, acompanhado do navegador Kazimierz Kubala, o avião, batizado de "Marszalek Pilsudski", partiu do aeródromo de La Bourget, nos arredores de Paris.
Após 3200 quilómetros de viagem, uma perda de óleo obrigou os pilotos a regressar à costa europeia. Ao fim de 31 horas de voo, Ludwik amarou, de emergência, perto de um navio mercante alemão, o "Samos". Foram recolhidos a cerca de 70 milhas náuticas a noroeste do Porto e o avião enviado para o fabricante.
... até à morte
A segunda tentativa saiu para os céus, outra vez de La Bourget, a 13 de julho de 1929. Após 2140 quilómetros de voo, o avião começou a perder potência e os pilotos decidiram aterrar na ilha açoriana do Faial. Com o aproximar da noite e a visibilidade reduzida após duas horas a tentar a aproximação, Ludwik optou por tentar uma aterragem de emergência na ilha Graciosa.
O local escolhido, um campo no lugar da Brasileira, na freguesia de Guadalupe, parecia plano mas escondia os típicos muros de pedra dos Açores. O avião bateu num muro e capotou na aterragem. O navegador sofreu ferimentos ligeiros e o piloto ficou gravemente ferido e encarcerado.
A população local acorreu ao local para tentar ajudar. Como estava a escurecer, levaram archotes e o avião pegou fogo. Idzikowski morreu carbonizado. No local do acidente, na Graciosa, foi construído um cruzeiro com parte dos destroços da aeronave.
Foi junto à lápide que recorda o acidente, que Ludwik Idzikowski foi homenageado pelos governos de Portugal e da Polónia. Um "desrespeito institucional", que o presidente o Governo Regional dos Açores, Vasco Cordeiro, fez saber ao ministro da Presidência, por carta.
Oportunismo do poder central
Vasco Cordeiro recorda o ministro Luís Marques Guedes de que já o havia alertado "de viva voz" para estas situações, a 17 de julho, num encontro no gabinete do primeiro-ministro em que ambos estiveram presentes.
Na altura, de acordo com o presidente do Governo dos Açores, foram apontadas deslocações de membros do Governo da República para "iniciativas institucionais" na região de que o executivo açoriano só teve conhecimento através da comunicação social.
O governante frisa que está em causa o desrespeito pela autonomia regional, nomeadamente dos seus órgãos de governo próprio, e que, "sendo reincidente, revela que estas situações não resultam de negligência, mas são intencionais".
O responsável sublinha que "está perfeitamente definido e claro" quem tem a cargo estas áreas em ambos os executivos.
"É por entender que, nesse caso, seja por convicção, por vontade ou até puro oportunismo, o respeito aos órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores e a correção que deve pautar o relacionamento institucional entre os dois governos não [foram] salvaguardados que tomo a iniciativa de lhe enviar esta carta", conclui Vasco Cordeiro.
Governo vai responder por carta
Questionado sobre esta situação, o ministro da Presidência confirmou ter recebido na quarta-feira à noite a comunicação de Vasco Cordeiro, adiantando que, entretanto, também já falou com o presidente do Governo Regional.
Insistindo que se tratou de um "lapso protocolar" que já lamentou junto de Vasco Cordeiro, Marques Guedes assegurou que "o Governo procurará que não volte a acontecer" tal situação, "porque o respeito protocolar entre as instituições também faz parte do regular funcionamento das mesmas".
O ministro da Presidência adiantou igualmente que, além do contacto que já teve com Vasco Cordeiro, irá responder à missiva do presidente do Governo Regional "também por escrito".
