
Nova editora revela que só vai apostar em obras literárias de qualidade
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"Três horas esquerdas", de Daniil Kharms, é o primeiro livro da Flop, uma editora que promete publicar apenas "altíssima literatura" e, por isso mesmo, diz estar condenada ao "colapso financeiro"
A mais jovem editora portuguesa, a Flop, chega ao mercado "com ideias antigas", como assume o seu quinteto de responsáveis. "Editar bons livros, criar um catálogo irrepreensível, partilhar bons autores e correr o risco de descobrir outros tantos" são as premissas que Adriana Correia Oliveira, Carolina Lapa, Luís Nobre, Rui Manuel Amaral e Tamina Sop vão tentar incutir no projeto.
É a vontade de "publicar apenas, e sem concessões, altíssima literatura" que torna claro o nome da editora "e certo o colapso financeiro", prosseguem.
Não há nestas palavras qualquer mordacidade, pois "é o que ditam os mercados". Apesar da ironia ou do fatalismo, acrescentam que "vamos tentar adiar o insucesso, mas sabemo-lo certo".
As tendências do mercado editorial português na última década, com o encerramento de pequenas editoras e o fortalecimento dos grandes grupos, dão razão ao aparente pessimismo, agravado por um circuito de venda e de distribuição pouco favorável aos interesses dos micro-editores.
A preocupação da Flop só não é maior porque, reforçam, "a ideia não é fazer lucro com isto. É criar outro tipo de riqueza, nem que para isso seja preciso gastar dinheiro (leia-se o nosso)".
Mas o enfoque crescente das grandes editoras no lucro imediato também tem as suas vantagens.
Vários autores de culto, mas desinteressantes do ponto de vista comercial, acabam por estar ao alcance de projetos independentes.
Como os livros do imortal Daniil Kharms, o vanguardista russo que foi perseguido sem piedade pelo regime comunista, alcançando apenas um reconhecimento póstumo. Fascinados pelos "humor, frescura e talento" de Kharms, os responsáveis da editora lograram recuperar uma tradução de Júlio Henriques inicialmente editada num volume artesanal pela companhia Marionet, em 2001, que serviu de base à peça "Três horas esquerdas".
A pré-venda do livro decorreu até ao dia 10, mediante o pagamento de seis euros, e permitiu a todos os interessados tornarem-se co-editores. Por isso, quando o livro sair da gráfica em breve, irá ostentar numa das páginas o nome dos que compraram previamente um exemplar. Os restantes podem fazê-lo contactando a editora ou em livrarias selecionadas.
"Sem colocar em causa a qualidade gráfica", os preços dos futuros livros continuarão a ser convidativos, muito próximos do custo da edição. Até porque "a nossa folha de Excel é feita com emojis".
A primeira apresentação pública de "Três horas esquerdas" vai acontecer no final de fevereiro. Na Sede, no Porto, o ator Nuno Pinto vai ler excertos da obra.
Outras editoras de resistência
& etc
A morte do histórico editor Vítor Silva Tavares, no final de 2015, precipitou o próprio fim da & etc, anunciado meio ano depois. Durante mais de 40 anos, a & etc foi "uma editora no subterrâneo", privilegiando as obras de forte vínculo autoral. Apesar da decisão, os títulos da chancela podem continuar a ser adquiridos na livraria Letra Livre, em Lisboa.
Edições mortas
Dificuldades económicas várias fizeram com que as Edições Mortas, do poeta e editor A. Dasilva O., resumissem a sua atividade nos últimos anos à edição de duas publicações, "Piolho" e "Estúpida". A primeira, já no 20º número, está virada para a poesia, enquanto a segunda elege o ensaio e a fotografia como os seus eixos.
Antígona
"Empurrar as palavras contra a ordem dominante do mundo" é o desígnio da Antígona, editora fundada em 1979 que nunca escondeu o gosto pelos textos de índole subversiva. Entre os mais de 260 títulos já publicados encontram-se livros de Henry Miller, George Orwell, Henry David Thoreau, Max Aub ou Georges Bataille.
