
Portuguesa ajudou vítimas do ataque ao Bataclan
CHRISTOPHE PETIT TESSON/EPA
Um mês depois dos atentados de Paris de 13 de novembro, a porteira portuguesa que ajudou vítimas do ataque ao Bataclan não se sente nem "estrela" nem "heroína" apesar das muitas entrevistas que deu à imprensa portuguesa e estrangeira.
"Se me dizem que sou uma heroína, que sou uma estrela, sinto-me mal. Não, não. Eu era Margarida, sou Margarida e continuarei a ser sempre a mesma Margarida. Nem mais, nem menos", contou Margarida de Santos Sousa à Lusa, com uma voz pausada e em torno de um chá, na mesma sala onde há um mês recordava a noite passada a socorrer as vítimas de um dos atentados de Paris.
A portuguesa lembrou que o desfile de jornalistas à porta de sua casa foi "outro pânico porque não esperava tanta gente pela porta dentro" e que teve de "recusar muita gente porque não paravam".
"Quase uma semana depois, ainda estavam constantemente atrás de mim. Não estava a contar com nada disso. Quando o fiz, não era para ter jornalistas à porta nem câmaras nem ninguém a fazer-me perguntas. Para mim, sinceramente, foi aquele pânico e aquele horror em que tive de ajudar e dar carinho àquelas pessoas", explicou.
Um mês depois dos atentados, Margarida ainda tem dificuldade em dormir e quando não dorme não consegue travar as imagens da noite em que abriu as portas do seu prédio e da sua casa para acolher os que escaparam ao ataque da sala de espetáculos ao pé do seu apartamento.
"Durante o dia, sinto-me mais ou menos, trabalho, ando entretida. À noite, quando estou em descanso, acabo por pensar mais um bocadinho. Mas claro que, aos poucos e poucos, vamos ter de continuar a viver como vivíamos antes apesar de ter muita pena de todos os que faleceram", disse, sublinhando que não tem medo.
Margarida Sousa tem recebido visitas de várias das pessoas que ajudou na noite dos atentados e também foi ao hospital ver a jovem baleada nas costas que teve os primeiros socorros no seu sofá.
"A mãe telefonou-me a dar novidades e disse-me que ela gostaria de me ver. Então, eu fui vê-la ao hospital. Fiquei muito surpreendida porque ela estava protegida no corpo por causa das balas, mas deu-me a novidade de que as balas não afetaram nada do andamento dela. Ela vai poder continuar a andar. Com a graça de Deus, ela vai continuar a vida dela, talvez daqui por dois meses, embora esteja muito chocada porque perdeu o companheiro", contou.
A portuguesa de Ermesinde, que vive há 35 anos em França e há 28 no bairro do Bataclan, lamenta que bem perto de sua casa pareça "um bocadinho um cemitério". Foi convidada para ir à abertura da sala de concertos no final de 2016, mas não pensa fazê-lo.
"Claro que quando a gente passa em frente ao Bataclan ainda fica um bocadinho aterrorizada de ver sobretudo aquelas velas, aquelas flores e o que se passou lá dentro. Eu tento nem imaginar o que se passou lá dentro apesar de já me terem dito que quando o Bataclan abrir os jovens querem lá ir todos e convidaram-me também, mas eu acho que não...", acrescentou.
O bairro continua enlutado um mês depois dos ataques e daqui a um mês é também o primeiro aniversário do atentado ao Charlie Hebdo, igualmente a poucos metros do apartamento de Margarida.
"A minha vida mudou? Eu já não era uma pessoa egoísta e não sou, mas acho que nos faz aprender na maneira de pensar, não vale a pena sermos egoístas, invejosos, soberbos. Nós não somos ninguém, tão depressa estamos aqui como já não estamos. O melhor é a gente tentar viver, sermos solidários".
Na noite de 13 de novembro, vários ataques simultâneos em Paris, levados a cabo por atiradores e bombistas suicidas, fizeram 130 mortos, numa série de atentados reivindicados pelo grupo extremista Estado Islâmico.
