A coligação PSD/CDS tem como "objetivo de longo alcance que Portugal se torne uma das dez mais competitivas economias mundiais". Ora, este objetivo tem muito que se lhe diga! Ou nada, dependendo da perspetiva!
Na verdade, os momentos que antecedem atos eleitorais são ricos em promessas, compromissos, definição de metas e objetivos. Se tudo funcionasse como deveria funcionar, estes momentos seriam, igualmente, aproveitados para balanços em relação às promessas e compromissos definidos na campanha eleitoral anterior. Seria também o momento de avaliação das metas e objetivos entretanto definidos.
No entanto, o cada vez maior afastamento dos cidadãos da vida política e dos políticos prejudica, paradoxalmente, este exercício. Numa altura em que o grau de exigência deveria estar mais apurado, vivemos precisamente a situação inversa, ou seja, os cidadãos cada vez menos fundamentam o seu voto nas promessas que são feitas, nos compromissos estabelecidos e nas avaliações que (não) se fazem dos mandatos que terminam.
De qualquer modo, os partidos vão fazendo o seu trabalho, temos que reconhecer. Os seus programas eleitorais são, em geral, exercícios de alguma complexidade e profundidade, embora muitas vezes desenvolvidos numa linguagem pouco clara e de difícil perceção por parte do eleitor "comum". Aliás, julgo mesmo que isso é feito, na maioria das vezes, de forma deliberada para prejudicar, precisamente, a avaliação. Estamos na lógica do "dá para tudo"!
Um exemplo concreto. No programa da coligação, segundo os seus autores (que não creio que sejam políticos), para se justificar "o reforço da nossa competitividade", são usados dois (e só dois) rankings internacionais que avaliam e comparam a competitividade de inúmeras economias mundiais: o Global Competitiveness Report 2014 do World Economic Forum (WEF), em que Portugal ocupa a 36.ª posição em 144 países; e o Doing Business (DB) 2015 do Banco Mundial, onde Portugal se encontra em 25.º lugar entre 189 países. Mais ainda: a coligação estabelece a meta de, na próxima legislatura, colocar Portugal no top 20 do DB e no top 25 do ranking do WEF.
Até aqui tudo certo. São utilizados dois rankings favoráveis ao que se pretende passar, o que é legítimo. Como também não deixa de ser legítimo a não utilização de outros que poderiam fragilizar o discurso. Por exemplo, no Innovation Union ScoreBoard, da Comissão Europeia, estamos na 17.ª posição entre os 28 da União Europeia (e caímos uma posição desde 2011), no The Europe 2020 Competitiveness Report, do WEF, estamos, também no contexto da UE28, na 15.ª posição, e no The Misery Index, da Bloomberg, entre 51 economias analisadas, somos a 10.ª mais miserável.
Assim, quando a coligação refere como objetivo de longo alcance tornar Portugal numa das dez mais competitivas economias mundiais, está a definir um objetivo que, em si, não nos diz grande coisa. Cirurgicamente, não é referido o que é isso de "longo alcance" nem mesmo que instrumento ou indicador será usado para monitorizar o resultado. E esta "falha" poderá ter uma explicação: pode muito bem ter sido a parte em que Passos Coelho, "viciado no engano", mexeu no programa eleitoral acrescentando uma frase forte e bonita! Porém, uma frase que não vale nada!
*DOUTORADO EM TECN. E SIST. DE INFORMAÇÃO
