Quanto mais cientistas ouço e leio mais acredito que um homem de 50 anos está tão longe de um jovem digital como Marco Polo estava de Colombo ou os copistas face a Gutemberg. Há qualquer coisa na velocidade de informação que está a tornar o processamento cerebral dos seres humanos diferente. A geração de nativos digitais está a chegar aos lugares de decisão todos os dias. Alguém se lembra da idade do inventor do Facebook? 29 anos.
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Eles vão fazê-lo através de novas empresas ou de grandes mudanças nas que existem. E esta vai ser a questão central do (ainda) nosso tempo: o fosso entre a multidão de infoexcluídos versus os que sabem navegar no 'futuro digital' está todos os dias a aumentar. O "desemprego de longa duração" é a ponta do iceberg deste choque geracional e civilizacional.
As manifestações 'twitter' do Irão, a Primavera Árabe, a revolta do Brasil contra o aumento dos transportes públicos ou por cá o nacional "15 de Setembro" contra a TSU foram movimentos democráticos gerados pelas redes sociais e liderados por nativos digitais viciados no 'agora'. Na economia a montanha russa é igual: caem empresas gigantes ou destroem-se setores de atividades inteiros, num ápice, por correntes de mercado que ninguém controla.
Hoje um miúdo de dez anos tem mais 'conhecimento' acumulado do que o grosso da população adulta (sobretudo a de baixa instrução). Obviamente este conhecimento não inclui tarefas básicas essenciais para o ser humano como agricultar, cozinhar ou tratar um bebé. Mas a questão é que essas tarefas já não são um obstáculo para quem nasceu a beber conteúdos como quem bebe água. Eles sabem procurar as respostas, em muitas línguas, num novo oceano - o da informação. O manual de sobrevivência chamado Wikipédia/YouTube responde a problemas de matemática ou pichelaria, como editar um filme ou fazer um bolo.
Por essa razão, não compreender a oportunidade que Portugal tem nos negócios da economia digital assentes nas artes, música ou cultura é um erro imenso. É não salvar o velho desemprego nem gerar novo. Quem conhece os festivais de cultura pela Europa sabe o que esta economia criativa representa. Edimburgo, na Escócia, por exemplo, é dos piores sítios para se passar um clássico agosto. É raro o dia que não chova e à noite está frio. Mas há dezenas de milhares de pessoas a fazer e a assistir a espetáculos durante um mês inteiro, transformando uma cidade, que estaria semivazia, num dos maiores sucessos económicos do negócio da cultura. O catálogo dos vários festivais de Edimburgo tem 340 páginas -aproximadamente três mil espetáculos a quase todas as horas do dia e da noite.
O grau de inovação de Edimburgo mostra como os europeus estão na vanguarda da criatividade artística e isso significa novos valores (morais, económicos e de sustentabilidade ambiental). Talvez só no Japão e nalgumas cidades dos Estados Unidos haja este grau de pioneirismo. Em Portugal os festivais de música são o símbolo desta nova geração e deste novo consumo. Estão quase sempre esgotados porque são eventos de emoção e comunidade indispensáveis às novas tribos sociais. Esta geração consome música - um produto digital - como se fosse oxigénio.
As emoções artísticas e as vendas digitais são 'os' mercados seguintes. E este é um ponto crítico para a economia portuguesa: o Governo andou nos primeiros dois anos a prometer mais apoios à indústria. Obviamente, é importante - são alguns dos setores tradicionais que nos têm valido. Mas é preciso investir na junção da cultura aos negócios digitais para se globalizar a economia. Sob pena de voltarmos aos anos 80: exportávamos produtos, não tínhamos ideias nem design.
Se nos próximos cinco anos não aumentarmos exponencialmente as vendas de produtos portugueses por Internet, não tivermos mais marketing digital e mais design incorporado no que fazemos, não há têxteis, sapatos ou metalomecânica de alta qualidade que nos valham. No entanto, para ainda apanharmos o barco, temos de investir em oportunidades de trabalho para a geração dos nativos digitais. Se eles continuam a emigrar é que nunca mais lá vamos.