O Programa de Estabilidade e Crescimento aprovado pelo Governo em abril aponta a necessidade de uma medida de sustentabilidade das pensões que melhore o saldo do sistema público de pensões em 600 milhões de euros. O documento não concretiza como obter essa melhoria, mas a ministra das Finanças esclareceu, entretanto, que ela pode implicar cortes no valor das pensões já em pagamento. A afirmação suscitou vários esclarecimentos e desmentidos por parte de outros membros do Governo. Mas o que foi dito, está dito. As palavras são como a pasta dos dentes, quando está fora é difícil voltar a pô-la dentro. O debate político e público sobre tal afirmação e suas razões e implicações está lançado.
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A Comissão Europeia publicou em meados de maio um relatório aprovado pelo Conselho Ecofin - The 2015 Ageing Report - com as projeções orçamentais dos 28 estados-membros até 2060. De acordo com o relatório, Portugal será dos países em que será mais acentuado o envelhecimento populacional: em 2060, o rácio de dependência (relação entre população com 65 ou mais anos e a população entre os 15 e os 64 anos) será o segundo mais elevado da UE. A tendência projetada é de redução da população total, da população ativa e do emprego. O crescimento potencial da economia será ligeiramente inferior a 1%.
A evolução demográfica e da economia condicionam fortemente a evolução das receitas e despesas da Segurança Social. O envelhecimento agrava os encargos. O fraco crescimento económico e a redução do emprego reduzem as contribuições. Qual o impacto destas tendências na evolução das contas do sistema público de pensões português? O relatório é esclarecedor. O peso no PIB das despesas com pensões vai aumentar de 13,8% em 2013 para 15% em 2030, mas baixa depois para 13,1% em 2060. Ou seja, estará 0,7 pontos percentuais abaixo do nível de 2013. Isto deve-se ao efeito das medidas tomadas nos últimos 10 anos. Por outro lado, o peso das contribuições no PIB irá baixar de 10,5% em 2013 para 9,6% em 2060. Em 2060, o saldo será assim inferior ao de 2013 em cerca de 0,3 pontos percentuais do PIB.
A insustentabilidade do sistema público de pensões implicaria um agravamento desmesurado e incomportável deste saldo. Mas repare-se que o problema não tem a ver com o agravamento da despesa com pensões, cujo peso até diminui. Tem a ver com a quebra na receita. Se o problema é de receita, por que não repensar o financiamento do sistema? Por que não apostar em mais crescimento e emprego? Porquê cortar as pensões? Porquê gerar incerteza, angustiar e sacrificar aqueles que, pela sua idade e fragilidade, pouca capacidade de resposta têm?
Francamente, não havia necessidade!