É uma vergonha vender a TAP por metade de Jorge Jesus, como afirmava no Parlamento o deputado socialista Rui Paulo Figueiredo? Fiquemos em terra, para já. A companhia aérea portuguesa estava tecnicamente falida. Impedida pelas regras de concorrência comunitárias de receber oxigénio do Estado. Fechada sobre si própria e sem estratégia. Com erros sérios de gestão acumulados por Fernando Pinto, tido no início da década de 2000 como um grande gestor, o salvador. Esteve quase lá. Mas depois não salvou. Ajudou a enterrar.
Daquilo que se conhece, com o negócio da privatização, que tem 15 anos (começou com António Guterres...), entram no imediato dez milhões nos cofres do Estado, mais 338 milhões a investir na empresa no próximo ano e meio. Depois, há a possibilidade de o encaixe ser maior, dependendo dos resultados, mas os "ses" são tantos, que não vale a pena perder muito tempo com isso.
A TAP não tinha, portanto, saída. Tem dos melhores e mais dedicados pilotos do Mundo (esqueçam lá a greve), pessoal empenhado e esforçado. E tem o resto tudo mau. Frota envelhecida, qualidade dos serviços a cair a pique, atrasos permanentes. Voa a preto e branco. E a democratização de viajar, que chegou com as "low cost", não bafejou a companhia.
Levantemos voo. Invocar razões estratégicas para manter a TAP no seio do Estado é sempre sonhador. E o novo consórcio promete essa rota: Lisboa como "hub" da lusofonia, não secundarizada face a Madrid; sede do consórcio em Portugal, etc., etc. Vale de pouco, na verdade. Ou vale enquanto for sustentável financeiramente.
Estratégico, para o país, teria sido não deixar cair da forma vergonhosa como se deixou a PT, manter a EDP, a REN ou a ANA. Estratégico é segurar o Estado social, a Saúde ou a Educação para todos, precisamente o que nos atenua as desigualdades sociais. A TAP já foi. Antes de ser estratégico pagar à Ryanair um valor por cada passageiro que aterre no Porto, ou incentivar as "low cost" a servir os Açores e a Madeira.
Resta, neste processo que o PS promete parar se for governo (logo se verá como e com que dinheiro), o prémio de consolação. Sem se saber a engenharia que está por detrás de todo o negócio, a aliança de David Neeleman com Humberto Pedrosa, dono da Barraqueiro, leva um português para os comandos da companhia. Um homem discreto, que começou a construir um império há 50 anos a partir da empresa do pai, e que ainda poderá encarnar algum tipo de patriotismo na salvaguarda dos interesses do país. É pouco, e um bocadinho nacionalista, mas é melhor do que nada.
