A poucos dias de eleições, as palavras de Sua Santidade o Papa Francisco, no Congresso dos Estados Unidos, continuam a ecoar na minha cabeça e no meu coração e, muito particularmente, o momento em que explicou que "um bom líder político é o que, atento ao interesse de todos, aproveita o momento com um espírito de abertura e pragmatismo". Saberemos estar atentos?
Falando na casa da política por excelência, o Papa não poupou nas palavras, nem se refugiou em frases de circunstância, antes interpelando diretamente os legisladores sobre alguns dos temas mais incómodos e mais necessários, como os dos emigrantes, da desigualdade ou da pena de morte.
Da sua passagem pelo Congresso ficam, como imagens mais marcantes, as lágrimas de políticos com a dureza de John Boehner ou Marco Rubio, mas sobretudo de John Lewis, um dos últimos ativistas de Selma e da luta pelos direitos civis, ao ouvir o Papa recordar Martin Luther King que conduziu a sua marcha como parte da campanha para alcançar o sonho de igualdade de direitos civis e políticos para os afro-americanos, afirmando que "aquele sonho continua a inspirar-nos", para concluir que são "sonhos que conduzem à ação, à participação, ao empenho. Sonhos que despertam para o que é mais fundo e verdadeiro na vida de um povo".
Misturando razão e emoção como ninguém, o Papa mostrou durante a viagem a Cuba e aos Estados Unidos a grandeza do seu pensamento e a bondade da sua ação, prosseguindo o caminho que assumiu desde a entronização.
Também a passagem pelas Nações Unidas constituiu um momento de enorme elevação, mas preferia, ainda assim, recordar a sua passagem pelo encontro das famílias em Filadélfia, com o alerta: "Um povo que não sabe tratar das crianças e dos avós é um povo sem futuro, porque não tem a força nem a memória que o faça avançar".
O seu projeto, sempre paciente e corajosamente repetido, é o de uma sociedade mais justa, mais fraterna, sem exclusões e preocupada com o legado para o futuro.
Habemus Papam é forma ritual como é anunciada, no Vaticano, a eleição do sumo pontífice mas, nestes anos de chumbo, em que nos encostaram à parede, foi-se tornando numa frase reconfortante para todos os que sentem que o Papa Francisco é um farol orientador e um porto de abrigo, como não encontram outro num Mundo de onde desapareceram os grandes líderes. Que as suas palavras e ação nos inspirem sempre.
Nota: Nuno Melo retoma a sua habitual crónica após as eleições legislativas
* ADVOGADO E DOCENTE UNIVERSITÁRIO
