À teoria sociológica do comportamento gera comportamento aplica-se o otimismo. Quando corre tudo bem, não há nada para correr mal. O que corre mal esfuma-se na avidez dos dias. O que corre bem contagia. Ou engana pelo contágio. Simples. E se ao Governo corre tudo bem, à Oposição corre tudo mal. Não por competência dos primeiros e incompetência dos segundos. É mesmo feitio. De uns e de outros. A convocação da desgraça, quando não atrai desgraça, faz-nos sentir desgraçados.
O que podia correr mal e corre bem? O Orçamento. A arte de distribuir o pouco que existe e o muito que se cobra. António Costa assenta todo o discurso na redução do peso dos impostos e no fim da austeridade. Ela não fugiu, está aí ao virar da esquina, latente e potente. Mas conta mais o que se diz e o que aparenta do que se diz, do que o que se faz e que só aparenta quando está feito. Pedro Passos Coelho passou os dias da troika a reclamar as contas em ordem e o país finalmente alinhado e alinhavado. Agora não há discurso para criticar o que, na verdade, poderia ser feito por um governo dele. Mais coisa, menos coisa. Sim, igual.
António Costa tem muitas travessuras, mas junta-lhe doçuras. As do tempo e do modo. Mas não vai além da troika. Diz que fica aquém. Verdadeiramente, entre o deve e haver das promessas feitas, e comparando programas e intenções, a diferença entre uns e outros esteve sobretudo na rapidez com que o PS revogou cortes salariais, promete aumentos, disfarça distribuição de taxas e de taxinhas.
O que podia correr mal corre bem. Dos casos da Galp, aos salários que passarão a ser praticados na Caixa Geral de Depósitos (o grande risco político que António Costa correu até hoje, mas, na verdade, o setor público não compete com privados se não for capaz de pagar, e na realidade um país que sufoca em tostões tem pouca legitimidade para pagar milhões, o leitor escolha o lado da reflexão), passando pelas listas de escusa de todo o Governo em lidar com matérias sobre as quais os ministros e secretários de Estado estão impedidos de lidar. Disse o das Finanças. Aqui, no JN.
O que podia correr mal corre bem. Até quando o líder da Oposição ultrapassa a dureza do pessimismo e abre as portas à relatividade do otimismo. Ele sabe que na cabeça dos portugueses está a prazo, marcado pelo presidente da República, mesmo que Marcelo o diga e desdiga e mesmo que não esteja. E António Costa sabe que na cabeça dos eleitores está para durar, mesmo que os dias lhe venham a trocar as voltas, que ele trocará antes de ser trocado.
Um tem doçuras, mesmo que sejam travessuras. E ao outro ninguém esquecerá. Ele é o símbolo do Halloween, mas só discursa travessuras e nada de doçuras.
*DIRETOR-EXECUTIVO
