Portugal tem uma nova estratégia: o otimismo. Eu não tenho nada contra. É melhor ser otimista que pessimista. Mas só o otimismo não nos salva. Será que não há nada de bom para dizer?
O primeiro-ministro diz-se sempre otimista, o presidente da República também. Os dois, na praça pública, trocam mimos muito otimistas. Marcelo revê-se no otimismo crónico, às vezes ligeiramente irritante, do seu aluno Costa. Diz que lhe vem dos tempos da faculdade, "Porque é mais novo".
É nisto que me lembro de um livro, muito divertido, maldito no seu tempo - escrito em segredo, no séc. XVIII, pelo filósofo iluminista Voltaire - e que tem o mesmo nome deste artigo: "Cândido, ou o Otimismo", onde também se contam as aventuras de um homem e do seu mestre.
Os protagonistas não são António e Marcelo, mas sim, Cândido e Pangloss. Cândido é um jovem que vive no belo castelo de um barão e o seu mestre é um filósofo com uma ideia fixa: todos vivemos no melhor dos mundos possíveis. E tudo corria bem aos dois até que, por causa de um beijo proibido dado a Cunegundes, filha do barão, Cândido é expulso.
Começa então a sua tragédia: é recrutado à força, testemunha o massacre da guerra, a sua amada é violada por soldados, chega a Lisboa no dia do terremoto e o seu mestre é enforcado pela inquisição. Tanta sorte...
Mas voltemos ao séc. XXI e à otimista terra de Portugal. Estamos dentro do castelo do Barão? Ou já beijámos a filha do patrão?
As coisas não correm bem: o défice aumenta, o desemprego sobe, a economia estagna, os bancos rebentam, as melhores escolas fecham, o gasóleo sobe, e a justiça patina. Mas mesmo assim Marcelo e Costa estão otimistas. Será que vale mesmo a pena a esperança?
Pode ser...mas para isso temos de acreditar - como dizia às vezes Pangloss a Cândido - que todos os acontecimentos estão devidamente encadeados no melhor dos mundos possíveis; pois afinal, se não nos tivéssemos endividado como loucos, pago do nosso bolso os estragos feitos por banqueiros vigaristas, vendido ao desbarato todas as empresas estratégicas, empobrecido significativamente os portugueses, destruído o tecido económico, fechado as melhores escolas e aumentado brutalmente os impostos, não estaríamos agora aqui, ouvindo professor e aluno trocarem mimos otimistas sobre o futuro risonho que nos espera.
Enquanto isso os sindicatos estão na rua a pedir aquilo que já sabem que vão ter. Vai ser bonito!
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