A 7 de agosto, referi, aqui, que não me queria pronunciar sobre o "caso" Selminho - empresa de Rui Moreira que, durante a vigência deste como presidente da Câmara, fez um acordo judicial com a autarquia relacionada com terrenos da zona da Arrábida (Porto), esperando conhecer os detalhes do processo.
No entanto, face ao que sei hoje, não posso deixar de me pronunciar, aqui, sobre este assunto que, na minha opinião, mancha indelevelmente o mandato de Moreira. A história é simples. Com a aprovação das Normas Provisórias de 1999, houve terrenos na zona da Arrábida a que foi concedida capacidade construtiva. A Selminho decidiu adquirir um desses terrenos, sendo que quem vendeu o mesmo a essa empresa teve que registar previamente o mesmo recorrendo à figura da usucapião. Acontece que a Câmara Municipal do Porto nunca emitiu nenhum documento que concedesse à empresa direitos construtivos irrevogáveis, tendo a entrada em vigor do PDM de 2006 retirado capacidade construtiva a parte desse terreno. É perfeitamente compreensível que a Selminho, perante esta situação, reclamasse, como fez, sendo que, invariavelmente foi perdendo nos tribunais essa sua pretensão. Aquando da tomada de posse de Rui Moreira como presidente da Câmara, estava a decorrer uma ação judicial intentada pela empresa contra a Câmara, que, no fundo, reclamava a classificação dada por esta aos terrenos (escarpa) e que justificavam a consideração de não edificabilidade dos mesmos. Ação que a Câmara tinha contestado em setembro de 2012, reiterando a sua posição de que a empresa não tinha esse direito...
Só que, a partir da tomada de posse de Moreira (outubro de 2013), a Câmara (ou, antes, os seus representantes legais, dado que o órgão eleito nunca foi tido nem achado no processo) altera radicalmente a sua posição, reconhecendo capacidade construtiva ao terreno e assumindo o compromisso de, em sede de revisão do PDM (que estava previsto concluir-se em 2016), alterar novamente o uso do solo do mesmo. Posição que teve expressão numa transação judicial (no fundo, um acordo judicial assinado pelas duas partes) com data de janeiro de 2014. Comprometendo-se, ainda, e caso tal não acontecesse, a pagar uma indemnização a ser fixada por um tribunal arbitral (cujo valor, naturalmente, terá em conta o reconhecimento prévio desse direito construtivo!).
Há aqui uma questão legal formal que se prende com o facto de os advogados da Câmara terem chegado a um acordo com base na procuração do seu presidente que era proprietário da empresa. Mas, para além disso, a questão está no facto de a Câmara ter alterado a sua posição após a tomada de posse de Moreira, não havendo nada que o justifique (risco assumido de perda de ação em tribunal ou parecer de serviços do urbanismo e/ou do ambiente que o fundamentem). Sendo que o próprio vereador do Urbanismo (responsável pela revisão do PDM) afirma não ter qualquer conhecimento desta alteração de posição da Câmara!
E esta suspeita de intervenção em benefício próprio não pode manter-se, perante o silêncio de Rui Moreira (que alega não poder falar do caso, por ser parte interessada...), enquanto se aguarda o desfecho judicial do processo. Porque o problema também é político, devendo ser esclarecido antes da campanha eleitoral que se aproxima...
* ENGENHEIRO
