A Polícia Judiciária (PJ) quis continuar a investigar Jorge Coelho no âmbito do processo sobre suspeitas de corrupção na Câmara de Cascais, envolvendo o ex-presidente, José Luís Judas, e o empreiteiro Américo Santo, mas o Ministério Público (MP) não deixou que fosse levantada a imunidade parlamentar do agora deputado do PS e ex-ministro para constituí-lo arguido. O procurador do MP de Cascais titular do inquérito assumiu total discordância com o inspector da PJ e decidiu arquivar todo o processo, considerando não existirem indícios suficientes de crime por parte de qualquer dos implicados.
No caso de Jorge Coelho, em causa estava o facto de, aquando de uma busca da PJ à sede de uma das empresas do construtor civil ter sido encontrada uma lista de prendas do "Natal 2000", em que constava a oferta de um tabuleiro de xadrez a Jorge Coelho. Tal facto originou junto dos investigadores suspeitas de terem sido cometidos pelo ex-ministro crimes de corrupção passiva ou tráfico de influências. Só que, na busca efectuada à casa de Coelho, não foi achada a referida prenda constante na lista de Américo Santo.
De acordo com informações recolhidas pelo JN, o facto de não ter encontrado a oferta não dissipou as suspeitas da PJ, que, no relatório final da investigação, tentou convencer o procurador da República de Cascais, Varela Martins, de que seria necessário promover diligências junto da Assembleia da República para levantar a imunidade parlamentar de Jorge Coelho de modo a constituí-lo arguido.
Fax enviado ao "dr. JC"
Para sustentar as suspeitas sobre Jorge Coelho, o inspector da PJ referiu, até, que foi apreendido um fax datado de Maio de 2001, em que era assinalado o envio ao "dr. JC" de um Plano de Pormenor de um hospital a construir em Cascais. Além disso, Coelho estaria prestes a integrar uma empresa de A. Santo, na qual iria ser presidente do Conselho Consultivo.
No entender da investigação da PJ, isto poderia indiciar uma presumível influência de Coelho num despacho conjunto assinado por membros do Governo da altura, chefiado por António Guterres, para declarar o interesse público, urgente, da desafectação de terrenos que estavam em Reserva Agrícola Nacional.
Todavia, apesar da insistência do inspector da PJ responsável pelo relatório , o magistrado titular do processo decidiu não acolher qualquer das sugestões. Argumentou que, pelas diligências efectuadas, não ficou sequer a suspeita de intervenção indirecta de Coelho nos negócios de Américo Santo com José Luís Judas, inclusivamente por não haver referências de testemunhas ao nome do ex-ministro. Por outro lado, o facto de não ter sido encontrado o tabuleiro de xadrez supostamente oferecido pelo empreiteiro seria suficiente para não se insistir no assunto. Acrescia, ainda, a circunstância de não haver certeza de que "JC" fosse Jorge Coelho.
Ainda segundo apurou o JN, outra proposta chumbada pelo magistrado teve a ver com a extracção de uma certidão para continuar a investigar os nomes constantes na "lista de prendas 2000" encontrada no escritório de Américo Santo. Entendia o inspector responsável que a existência de nomes ligados à autarquia de Coimbra no documento poderia ser indício da obtenção de mais favores ilícitos. O procurador, porém, considerou as suspeitas sem fundamento.
As desavenças entre a PJ e o MP na investigação sobre as relações do empreiteiro Américo Santo e a Câmara de Cascais não se limitaram à análise sobre a eventual intervenção de Jorge Coelho. Aliás, o principal ponto de discórdia está no facto de a PJ ter proposto acusação por crimes de gestão danosa, corrupção, participação económica em negócio, prevaricação e abuso de poder. Porém, desde o início, o MP entendeu que apenas poderia estar em causa tráfico de influências. No final, o procurador entendeu que não houve qualquer crime. José Luís Judas não quis comentar este arquivamento no MP.
