Com o imersivo "Wall of eyes", o trio britânico escapa à maldição do segundo disco e confirmam os bons augúrios de "A light for attracting attention".
Corpo do artigo
É uma doutrina nascida da experiência: às poucas certezas na vida podemos juntar o facto de que, sempre que Thom Yorke e Jonny Greenwood se juntam, algo de bonito acontece e a música como a conhecemos expande.
Os dois elementos dos Radiohead, agora em The Smile – projeto à parte da banda de Oxford, nascido da saturação da pressão de supergrupo mas que não determina a sua extinção – juntaram-se ao baterista jazz Tom Skinner e voltam com “Wall of eyes”. Um segundo disco do trio sem “a maldição” do álbum #2, ou a pressão assumida pelos artistas de equipararem um primeiro registo bem-sucedido, tentando, porém, avançar.
É de avançar que se fala sempre que se juntam Yorke e Greenwood, é para eles inato, e desde que se uniram nos Radiohead mais nada têm feito a não ser arrojar, criar regras para logo as mudar, construir ambientes irreprisáveis e inadvertidas bandas sonoras de vidas, ansiedades sonoras e prenúncios até de maleitas globais: ironizava há poucos anos o apresentador Stephen Colbert a Yorke com a dúvida sobre qual era para ele, depois de décadas a ver e cantar o mundo num lado mais cinzento, paranoico, a falar de desaires políticos, tecnológicos e sociais, a sensação de ter acertado.
Nos The Smile e em “Wall of eyes” há de novo critica social, amor (ou desamor), pandemia, acidentes metafóricos, mas regras e estruturas são quase inexistentes: a música viaja, livre e desconstruída, em oito temas absorventes, esbatidos, jazz, psych rock e clássico em fusão, com violinos e solos de guitarra mesclados com os esmerados arranjos da London Contemporary Orchestra. Uma imersão nos devaneios de músicos que, quando não têm a certeza se vão na direção certa, simplesmente mudam de direção.
“Posso ir a qualquer lugar que eu quiser; Só tenho que me virar do avesso e de trás para frente” canta Yorke em “Friend of a friend”, apoiado por um vídeo brilhante de Paul Thomas Anderson filmado numa sala de aula onde as crianças ouvem e reagem, sem filtros, a uma música que serão muito novas para compreender; mas ainda assim, em alguns casos, visivelmente já conseguem sentir.
“Wall of eyes”
The Smile
XL Recordings
(Os The Smile atuam no MEO Kalorama em agosto)