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Em Portugal, as praias são públicas. E que assim continuem por direito, por justiça e por amor. São bens de todos, como o ar, a luz, o horizonte. Nos últimos anos, quem anda atento sobretudo ao Alentejo, percebe um fenómeno disfarçado de progresso: terrenos comprados, cancelas colocadas. A praia em si não se pode vender, a lei protege-a. Mas tudo em volta começa a ser comprado, vedado, limitado. A praia ainda é pública, mas, na prática, vai-se tornando privativa, roubada a conta-gotas. Nunca esquecer que todos devemos ter o direito de chegar ao mar, descalçar as preocupações, sentir a areia quente, cheirar a maresia que acorda cedo e ver o sol cair sobre as ondas, com o rosto ainda molhado. No Alentejo, onde a terra fala baixo e o tempo anda devagar, não podemos deixar que o silêncio sirva para calar quem quer tudo para si. E, também devagarinho e quase sem se ver, não fossem hoje as novas tecnologias que nos permitem voar sobre o território, estas metodologias tentam contaminar o resto do país, na busca de uma sociedade cada vez mais individualista e segregada. É uma estratégia silenciosa e quase cínica. Não se fecha o mar, mas estrangula-se a estrada que leva até ele. O direito vai-se desvanecendo sem gritos, como se fosse natural. Mas não é. A praia não é luxo, é vida. Todos temos direito a estar nesse chão e não é um capricho, é parte da identidade coletiva. As praias, como as cidades, devem ser livres. São lugares de encontro, de memória de férias da infância. Não deixemos que nos roubem aquilo que é de todos. Que nunca se perca este direito conquistado.