Feira da Foda conquistou "meio mundo" mas registo institucional da marca foi recusado
A pacata aldeia de Pias, em Monção, vai receber esta sexta-feira e domingo um evento que anda nas bocas do mundo: a Feira da Foda. O certame vai na 6.ª edição e atrai milhares de pessoas de todo o país e estrangeiros, principalmente da vizinha Espanha e do Brasil, bem como comunidades emigrantes.
Corpo do artigo
A população local soletra com gosto e orgulho, já há várias gerações, o palavrão, que nada mais é que um prato de cordeiro assado no forno a pingar num alguidar de arroz amarelo, que tem uma curiosa história por trás. Mas o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) recusou recentemente o registo da marca, por considerar que envolve "calão".
O pedido feito, este ano, pela junta de freguesia, que organiza a feira há seis edições, não foi aceite, mas o presidente da junta de Pias afirma que não vai desistir do registo, em prol da proteção e valorização de uma tradição centenária.
“Tem havido alguma dificuldade realmente em registar o nome por parte das instituições que fazem o registo. Ainda consideram que tem um enquadramento pejorativo e não refletem aquilo que é a nossa realidade. Focam-se só na palavra e pensam que é calão”, afirma o autarca, Gaspar de Castro, defendendo que a Feira da Foda “tem uma parte cultural e de história, já bastante longínqua”.
Este certame nasceu numa antiga feira de rês, onde criadores e contratadores levavam o seu gado ovino, mas para o engordar e poder vender pelo melhor preço, colocavam sal na forragem, obrigando os animais a beber muita água. De barriga cheia de água e pesados, os animais eram bem vendidos aos mais incautos, que só mais tarde se apercebiam do engano e exclamavam, à boa maneira minhota,: “Que grande Foda!”.
Gaspar de Castro teme que haja alguma situação que “possa lesar” a freguesia.
“Devíamos zelar, proteger e valorizar este nome, que a população deu a esta feira", insiste, recordando que, face ao sucesso do evento, uma associação ligada à comunidade portuguesa no Brasil que organiza “um grande festival no estado de São Paulo”, pretende “fazer lá uma edição temática, com o nome e com a marca, com o apoio das instituições estatais brasileiras”.
Três dias de "Foda"
Em Pias, numa tenda com capacidade para cinco mil pessoas, a “Foda” será servida ao longo de três dias. Estão preparados “300 animais” de criadores da região, para satisfazer os desejos dos visitantes. A carne é assada em cinco casas de habitantes da aldeia.
No recinto, estarão cerca de uma centena de expositores, entre eles, oito de vinho Alvarinho da Sub-região Monção Melgaço. Haverá diversão para as famílias e animação musical.
Sábado, está previsto um workshop sobre o prato, a cargo de Prazeres Domingues, de 63 anos, natural da freguesia vizinha de Cambeses, mas casada com um habitante de Pias. Ao JN, contou que “uma boa Foda" precisa de “um bom carneirinho”, que precisa ser “bem esfregado” com água e limão, “para tirar as impurezas”, e vai para um alguidar “com cebola alho, sal, vinho branco e vinagre”, onde lhe são dados “banhos [com essa marinhada para impregnar os temperos], três vezes ao dia, durante 48 horas”.
Depois vai ao forno de lenha (de preferência), assa, e à parte prepara-se “uma calda para o arroz, com presunto, chouriço e carne de vaca”. Depois, numa terrina coloca-se essa calda com arroz e açafrão e, por cima, numa grelha, o carneiro.
“O segredo da Foda é ser bem esfregada de preferência”, brinca Prazeres, que costuma cozinhar a dita em casa para a família e que até já conquistou pela barriga, a sua “neta postiça”, Lara Nombela, de 20 anos, natural de Ponteareas (Galiza), que namora um dos seus netos. A jovem confirma o gosto pela iguaria de Pias: “Há que fazer parte disto. Gosto mesmo do prato. Adoro. Ir ao domingo a casa da Prazeres e comer Foda é normal. É bom. Sempre que há Foda vou”.