Cada vez mais portugueses residentes em zonas próximas a Espanha estão a ir a consultas privadas e a fazer tratamentos médicos do outro lado da fronteira, onde há mais médicos disponíveis e o atendimento é mais rápido.
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A falta de médicos, a dificuldade em aceder a consultas de especialidade e a demora em conseguir fazer exames ou tratamentos são os principais motivos que levam os residentes de zonas raianas a procurar assistência médica em Espanha.
Os residentes em Elvas, no distrito de Portalegre, deslocam-se com frequência a Badajoz (Espanha) pelos mais variados motivos e as questões relacionadas com a Saúde não são uma exceção, porque faltam médicos naquela região.
Eurico Branca, residente naquela cidade raiana, situada a poucos quilómetros de Badajoz, disse à Lusa que subscreveu para toda a família, quando a sua filha nasceu, há cerca de dois anos, um seguro de saúde em Portugal, podendo utilizá-lo em Espanha. “Aqui ao lado [Badajoz] temos pediatras com todas as valências e vamos muito ao estrangeiro. Não tem a ver com a rapidez [facilidade em agendar consultas] é a questão de não existir [pediatras] na zona, a diferença é entre existir serviço e não haver serviço”, disse.
Para Eurico Branca, é um “privilégio” viver ao lado de Espanha e poder utilizar um seguro com uma apólice que inclui a extensão ao estrangeiro. “Mas, independentemente do seguro, eu ia sempre a Espanha, naturalmente”, sublinhou.
A mais de 300 quilómetros, em Freixo de Espada à Cinta, no distrito de Bragança, o taxista Francisco Marques contou à Lusa que é solicitado para transportar pessoas até uma clínica em Espanha, porque tudo é mais rápido no que diz respeito à realização de exames complementares de diagnóstico ou uma consulta médica.
“O que as pessoas me contam na viagem é que estão mais aflitos e pretendem ter exames médicos mais rápido, bem como uma consulta. Depois de fazerem os exames, trazem-nos ao médico de família, poupando tempo, já que no espaço de uma semana tudo se pode resolver”, explicou, acrescentando ainda que “as pessoas do seu concelho podem andar cerca de 200 quilómetros de táxi para fazer estes exames médicos de forma mais rápida”.
Desde que Celso Alturas, de 36 anos, descobriu a clínica em Xinzo de Limia, em Espanha, a 77 quilómetros da aldeia de Selhariz onde vive, perto de Vidago, no concelho de Chaves, distrito de Vila Real, que ali vai periodicamente fazer um check-up. Por cerca de 120 euros faz todas as análises e exames necessários e sem esperas.
Segundo realçou, é precisamente a poupança de tempo a principal motivação para esta deslocação à clínica espanhola. “É tudo feito no mesmo sítio e na mesma hora”, frisou.
Barrancos procura alternativas ao centro de saúde local
Com apenas um médico durante a semana e outro aos fins de semana, a população de Barrancos, distrito de Beja, tem de procurar alternativas quando não tem clínico e até recorre a Espanha, ali a dois passos.
Inaugurado há pouco mais de 10 anos no edifício de uma antiga escola primária, o Centro de Saúde de Barrancos funciona apenas durante os dias de semana, das 8.30 às 17.30 horas, com o médico cubano Diosdado Matias a assegurar consultas abertas e por marcação.
Já aos fins de semana, devido à falta de médicos, o centro de saúde está fechado, mas um clínico espanhol, pago pela câmara municipal, presta serviço naquelas instalações em regime de consulta aberta.
Residente em Barrancos, Andrés Rodriguez, confessa à agência Lusa que esta “realidade é muito perturbadora”, por haver períodos do dia em que não há médico disponível no centro de saúde e, mesmo quando há, ser difícil conseguir uma consulta de urgência.
O morador, que é barbeiro na vila alentejana e tem nacionalidade portuguesa e espanhola, conta que quem precisa de uma consulta aberta tem de ir cedo para a porta do centro de saúde “para apanhar vez” e conseguir uma das senhas. “E, se as senhas disponíveis para o dia já estiverem esgotadas, a pessoa já não vai ser atendida”, relata à Lusa, em dois dedos de conversa na ‘sala de visitas’ de Barrancos, a Praça da Liberdade.
Também Paula Reganha, que regressa ao trabalho após o almoço, alega à Lusa que “não é fácil arranjar senha” para uma consulta aberta. Para si, a alternativa é o Centro de Saúde de Moura, a 50 quilómetros, ou o hospital de Beja, a 100. “Vou mais a Portugal, mas tenho conhecimento que vão muitas pessoas a Espanha”, salienta, dando o exemplo do centro de saúde da povoação espanhola de Encinasola, na província de Huelva, que dista nove quilómetros e está aberto 24 horas por dia.
Paula diz que este centro de saúde em Espanha “foi muitas vezes a salvação de Barrancos”, no tempo em que o médico espanhol Modesto Hierro, que, entretanto, se reformou, dava consultas, mas “agora não é tão fácil”. Atualmente, frisa, a população de Barrancos já não recorre tanto a este centro de saúde.
Andrés, por ter dupla nacionalidade, reconhece que utiliza os serviços dos dois países, mas considera que “vale mais a pena ir a um médico privado” do outro lado da fronteira. E é o que alguns habitantes de Barrancos fazem, relata, referindo que costumam ir a uma clínica de saúde situada em Cortegana, também na Andaluzia, mas a cerca de 50 quilómetros da vila alentejana.
Os portugueses, alega Andrés Rodriguez, “vão lá, se for preciso, fazem ali um raio-X e pagam o que têm de pagar” e, assim, conseguem ter “uma resposta muito mais rápida do que em Portugal, mesmo no privado”. “Para mim, isto aqui está pior que nos Estados Unidos. Qualquer pessoa que não tenha um seguro de saúde em Portugal está feita ao bife”, desabafa.
O Centro de Saúde de Barrancos também recebe, durante a semana, em dias e horários específicos, outros clínicos para consultas de psicologia, saúde materna e infantil ou planeamento familiar, entre outras.