Protagonista da série “Morangos com açúcar” divide o tempo entre o Porto, onde nasceu, e Lisboa, onde tem trabalho. “A cultura em Portugal tem o problema da centralização", diz o jovem ator em entrevista ao JN.
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Nasceu há 22 anos no hospital de Matosinhos, viveu a infância em Gaia e cresceu no Porto, em Cedofeita. Recorda os passeios junto ao Palácio de Cristal e as corridas para “andar pendurado” no elétrico. Nos últimos meses, Vicente Gil tem andado entre Porto e Lisboa, onde gravou a nova temporada da série da TVI “Morangos com açúcar”, na qual é o protagonista Miguel.
“A cultura em Portugal tem o problema da centralização. Está mais sediada em Lisboa, mas dei o salto para estar em meios culturais fora do meu. Então, ando entre Lisboa e Porto”, conta ao JN.
Graças à mãe, a atriz Maria Gil, o jovem traz nas memórias o contacto com o mundo cultural: “A minha mãe sempre me levou e aos meus irmãos ao teatro. Vi dança, performances na rua, as minhas melhores memórias têm a ver com as artes”, diz Vicente enquanto desfia outras memórias como “as idas ao teatro no S. João, no Rivoli, no Bolhão”.
“A minha mãe trabalhou sempre como ativista, é atriz, e comecei a fazer teatro comunitário com os meus irmãos aos 12 anos”. O gosto pela representação levou-o a estudar na escola de artes e a tirar o curso na Escola Superior de Teatro e Cinema.
A inspiração da mãe
Nas palavras de Vicente Gil cabe sempre a palavra “mãe”. “É a pessoa que mais me inspira, é inteligente, sensível, com uma grande personalidade e uma atriz brilhante”, elogia. O orgulho estende-se às raízes. “Somos ciganos. Há uma causa associada, no caso da minha mãe, à luta feminista e pelo ativismo cigano. Vivi sempre nesta relação de crescer com um pensamento crítico sobre o mundo, a sociedade, os valores e a política”.
As raízes, defende, ajudaram-no a comunicar. “Tenho orgulho em ser cigano, a minha forma de ver o mundo deve-se à minha origem porque existe uma maneira de estar com o outro e com a natureza muito própria dos ciganos. Isso ajudou-me a ser uma pessoa comunicativa, que gosta de criar relações”.
“Segregação ainda é séria”
Para Vicente Gil “a segregação ainda é um problema sério”, mas na sua geração já se notam diferenças. “Estamos habituados a criar relações diferentes com a comunidade maioritária, crescemos a aprender lidar com isso e a conviver com ela”.
Com uma mãe atriz, um irmão gémeo, Salvador, ator, uma irmã, Mariana, na área da comunicação e o irmão mais velho, António, no Turismo, Vicente admite que a arte de trabalhar para o público “está um pouco no sangue da família”. A ideia é “exigir pessoas ciganas em lugares de privilégio da comunicação. Espero ser uma pessoa que potencie isso”, garante.
O ator faz um balanço de “Morangos com açúcar”, que começou com uma média de 800 mil telespetadores na estreia, mas que registou uma média de 650 mil pessoas no quarto episódio. “Tudo o que tenho lido e ouvido superou as expectativas e é um produto que se apresentou com beleza e com brio”
Orgulho nos valores que regem a família
Orgulhosa dos quatro filhos, a atriz Maria Gil, por seu lado, vê com bons olhos o caminho que Vicente está a trilhar, destacando “os valores que o regem” e sem o limitar à visibilidade de “Morangos com açúcar”.
“Como ator, o Vicente tem, como retaguarda, os valores que efetivamente tem como pessoa. Tem a vantagem de, pelo facto de pertencer a uma família cigana, conhecer vários lados da sociedade. Isso imprime-se no que ele é e no seu trabalho”, diz ao JN.
Maria tem a codireção e dramaturgia de “Homo sacer”, do Teatro Nacional D. Maria II, que estreia no dia 24, em Montemor-o-Novo, e que chegou a ter Vicente no elenco. “Independentemente do projeto que faça, tenho inteira confiança no seu percurso e na sua entrega”, remata a mãe.