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Com a já costumeira e estrondosa violação do segredo de justiça, foi noticiada, quase em tempo real, a realização de buscas e apreensão no domicílio, e não só, de um conhecido cantor português de música ligeira. A diligência foi determinada pelo MP no âmbito de um processo por crimes de tráfico de estupefacientes e de branqueamento. O referido artista, um dos vários arguidos, estará indiciado pela prática deste último tipo de ilícito. Represtinando artigo que já escrevi, o crime de branqueamento traduz-se na dissimulação das vantagens obtidas com a prática de determinados ilícitos. Dispõe a lei que quem converter, transferir, auxiliar ou facilitar alguma operação de conversão ou transferência de vantagens, obtidas por si ou por terceiro, directa ou indirectamente, com o fim de dissimular a sua origem ilícita, ou de evitar que o autor ou o participante dessas infracções seja criminalmente perseguido... é punido com pena de prisão até 12 anos. O mesmo normativo elenca os crimes subjacentes e define o conceito daquelas vantagens. A doutrina e a jurisprudência são consensuais no entendimento de qual o percurso seguido para a lavagem dos bens ilícitos obtidos: são três as etapas seguidas. O criminoso procede à colocação daqueles bens em instituições financeiras e não financeiras, passando depois à sua circulação e, finalmente, à sua integração, transformando-os em produtos aparentemente lícitos e legítimos. Um dos procedimentos de colocação e circulação das vantagens do crime é a distribuição das mesmas por familiares e amigos de confiança, testas de ferro, ou o depósito em diversas instituições financeiras de montantes em dinheiro inferiores aos que exigem intervenção preventiva daquelas entidades ou a comunicação ao MP e à PJ, impostas pela lei da prevenção de branqueamento de capitais. Procedem a diversas operações de transferências bancárias, falsos pagamentos de débitos a terceiros de confiança, empresas-fantasmas e aparentes negócios lícitos. Alcançada a normalização destas operações de circulação, o senhor do crime procede à legalização dos bens sujos, passados por uma verdadeira máquina de lavagem, colocando-os na vida económica e financeira, nacional ou transnacional. O crime de branqueamento consta do título V do CP, dos crimes contra o Estado, capítulo III – dos crimes contra a realização da justiça. É, pois, um crime grave que atinge todos nós, cidadãos, e dificulta a acção da justiça no combate à criminalidade organizada, terrorista ou criminalidade económico-financeira, para além de procurar dificultar o confisco pela justiça dos proventos resultantes de actividades ilícitas. É um crime grave, de consequências sociais, económicas e financeiras muito negativas para o país e sua reputação. Neste combate é imprescindível a colaboração das entidades a que recorrem os criminosos para a prática deste tipo de crimes.
*A autora escreve segundo a antiga ortografia

