Novas acusações de agressão sexual contra investigador que voltou a trabalhar no CES
Duas mulheres acusam Bruno Sena Martins, investigador do Centro de Estudos Sociais (CES), em Coimbra, de violência sexual. O antropólogo foi visado, à semelhança do sociólogo Boaventura de Sousa Santos, num livro sobre assédio na academia. Em março, o CES anunciou que Sena Martins voltou aos cargos na instituição.
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Dois anos após a publicação do livro "Má conduta sexual na Academia - Para uma Ética de Cuidado na Universidade", em abril de 2023 pela editora académica Routledge, surgem novas acusações contra o investigador do CES, Bruno Sena Martins. Num capítulo da obra, o antropólogo Bruno Sena Martins e o sociólogo Boaventura de Sousa Santos são acusados de assédio sexual e moral contra mulheres investigadoras que estudaram e trabalharam no CES. Andrea Vásquez e Helen Barbosa dos Santos, estudantes e investigadoras que fizeram cursos de verão no CES, afirmaram ao jornal "Diário de Notícias" terem sido vítimas de violência sexual por Bruno Sena Martins.
As duas mulheres juntam-se assim a Miye Nadya Tom, uma das autoras do artigo que espoletou o escândalo no CES e que acusa Bruno Sena Martins de agressão sexual. Contactado pelo DN, Bruno Sena Martins não quis dar quaisquer esclarecimentos. Em março deste ano, o CES e o próprio Bruno Sena Martins anunciaram que o antropólogo estava de volta à instituição, depois de ter pedido a autossuspensão dos cargos que ocupava, enquanto decorriam os processos de averiguação sobre as denúncias de assédio e agressão sexual.
"O inquérito concluiu que não havia qualquer fundamento para um processo disciplinar contra mim", disse, na altura, Bruno Sena Martins à agência Lusa. De recordar que as conclusões de uma comissão independente, em março do ano passado, apontaram existir padrões de conduta de abuso de poder e assédio no CES, por parte de pessoas em posições hierarquicamente superiores. Mais tarde, foi formada uma comissão prévia de inquérito do CES para avaliar a necessidade da instauração de processos disciplinares. Enquanto Bruno Sena Martins voltou ao CES, Boaventura de Sousa Santos acusou a instituição de "linchamento".
Disponível para dar testemunho
Andrea relata ao DN que participou num curso de verão, em 2017, realizado num hotel em Coimbra. Depois das aulas, os alunos e professores ficavam a conviver. "Na noite em causa eu tinha bebido bastante e estava ali, numa zona do rés do chão, sentada. E o Bruno sentou-se ao pé de mim e começou a tocar-me. Não me beijou ou algo assim, pôs a mão dele dentro dos meus calções", conta.
No relatório da comissão independente do CES, publicado em março de 2024, os especialistas referiram haver "indícios de que atividades de integração informais (por exemplo, jantares, convívios fora do CES) geraram situações inadequadas ao contexto académico". Além disso, as situações de alegado assédio e agressão sexual ocorriam maioritariamente fora do local de trabalho, em horário pós-laboral e após o consumo de álcool, o que reforçava "a falta de fronteiras seguras entre a esfera profissional e a esfera privada".
Andrea garante ter informado a comissão independente de que estava disponível para dar o seu testemunho, desde que mantivessem o seu anonimato, mas disse não ter obtido qualquer resposta. A investigadora académica aponta que a existência de um coletivo de denunciantes veio reforçar a necessidade de contar a sua versão da história. Parte dos membros desse coletivo estão em julgamento após Boaventura de Sousa Santos ter interposto uma ação judicial em defesa do seu bom nome.
Pediu para entrar no quarto
Também Helen considera que está no "dever ético" de denunciar o que se passou consigo, depois de saber que alegadamente não terá sido a única. Helen participou no curso de verão de 2017, em junho, mas a alegada situação de agressão sexual cometida por Bruno Sena Martins ocorreu um mês antes, em maio. Depois de terem assistido a uma aula de Boaventura de Sousa Santos, Helen e uma amiga ficaram a dormir na casa de Bruno Sena Martins.
A então estudante de doutoramento acusa o antropólogo de lhe ter tocado na perna num bar e, depois, na casa do próprio, entrou no quarto onde as duas mulheres iam dormir. "Estávamos na cama e ele deitou-se e foi aí o abuso. Me agarrou muito forte por trás e pegou os meus peitos. Dei um grito e quando gritei, ele se deu conta e saiu do quarto", relatou ao DN.
O julgamento sobre a ação judicial interposta por Boaventura de Sousa Santos está suspenso depois de terem sido detetados problemas técnicos nas gravações. Em entrevista à CNN, no passado domingo, o sociólogo afirmou que nenhuma das mulheres que o acusa de assédio sexual e moral "pode invocar ter tido contacto físico ou íntimo" com o próprio. "Cometi erros, mas não foram desse tipo", referiu. Está ainda em curso um inquérito no Ministério Público, aberto na sequência das conclusões da comissão independente do CES.