Reserva de 383 toneladas valorizou 25 milhões de euros por dia, só este ano. Tesouro de Portugal é o 13.º maior do Mundo.
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Quem pode vender o ouro do Estado?
O Banco de Portugal tem independência para decidir o destino da reserva de ouro. Pode vendê-la, mas também pode comprar (há vários bancos centrais a fazê-lo), sem interferência do Governo ou da Assembleia da República. O dinheiro de uma eventual venda não reverteria de forma automática para o Estado. O BdP pode usá-lo, por exemplo, para as suas próprias provisões (recorde-se que deverá registar prejuízos nos próximos dois anos). Só chegaria aos cofres públicos sob a forma de distribuição de dividendos e, de novo, quando e na quantidade decididos por Mário Centeno e seus pares.
Quando se vendeu ouro pela última vez?
A operação mais recente de venda de ouro deu-se entre 2002 e 2006, com o socialista Vítor Constâncio como governador: foram 225 toneladas, em várias tranches, que deram origem a comunicados lacónicos, sem referência a valores. Num dos raros casos em que o BdP decidiu dar explicações adicionais, logo em 2002, argumentava que “o ouro é normalmente um ativo com baixa rentabilidade financeira”, que “já não desempenha uma função monetária como em épocas passadas” e que a quantidade era “excessiva e não permite otimizar no longo prazo a rentabilidade das reservas externas do país”.
Quando se deve vender ou comprar ouro?
Não se conhecem critérios públicos definidos para a venda (ou compra) de ouro por parte do BdP. Mas, em 2007, depois da venda de 225 toneladas, o PCP achou que a reserva não deveria ser tratada de forma casuística e fez uma recomendação ao Governo de Sócrates, sugerindo alguns princípios: vendas em período de alta das cotações ou períodos de crise; que uma parte do produto dessas vendas fosse usada para amortizar dívida pública e a outra reservada para voltar a comprar, quando o preço baixasse; e formar uma comissão com BdP, Ministério das Finanças e partidos, para fixar princípios a cada legislatura. A transparência não vingou.
Há outras formas de rentabilizar a reserva?
Os lingotes de ouro da reserva portuguesa estão depositados em dois locais: metade no cofre-forte das instalações do BdP no Carregado (também conhecidas por fábrica do dinheiro), a outra metade no Banco de Inglaterra. E está em Londres, quer por razões de segurança, quer porque, apesar de imobilizado, é possível fazer negócio com o ouro. O BdP faz empréstimos de ouro a investidores (mesmo que, fisicamente, as barras fiquem sempre no mesmo local) e cobra uma taxa. No ano passado, conseguiu uma receita de 70 milhões de euros com os empréstimos. Ao longo dos últimos cinco anos, foram cerca de 250 milhões.
O tesouro de Portugal é significativo?
Portugal é o 13.º país com maior reserva de ouro e o 5.º entre os países da União Europeia. Uma posição entre as maiores potências mundiais, apesar da nossa relativa pequenez: estamos em 87.º lugar em população, no 50.º em termos de Produto Interno Bruto (a riqueza produzida anualmente) e em 37.º no PIB per capita. Temos três vezes mais ouro do que o Brasil (a antiga colónia que nos permitiu começar a entesourar), apesar de os brasileiros terem um PIB oito vezes maior. Temos também mais ouro que o Reino Unido, um dos países do G7, com um PIB 12 vezes maior que o português.
Como compara com países de dimensão semelhante?
Quando se compara a dimensão da reserva de ouro portuguesa com a de outros países da UE com uma população semelhante (todos a rondar os dez milhões de pessoas), estamos sempre na frente: três vezes mais ouro que a Grécia e a Suécia, mais quatro que a Hungria, mais nove do que a Chéquia. Se a comparação for com os países da UE com o PIB que se aproxima mais do nosso (sensivelmente entre 200 e 300 mil milhões de euros), fazemos de novo figura de ricos: três vezes mais ouro que a Grécia e a Roménia, quatro vezes face à Hungria, oito por comparação com a Finlândia e um tesouro nove vezes maior que o da Chéquia.
Quanto renderia o ouro por cabeça?
Uma forma mais “próxima” de perceber as diferenças entre as reservas de ouro dos diferentes países é através do valor per capita (quanto cada habitante “receberia” se os bancos centrais vendessem o seu ouro ao preço mais alto de mercado desta semana): cada português teria “direito” a 2716 euros, ou seja, apenas abaixo dos italianos (3093 euros) e dos alemães (2950). Os franceses “receberiam” 2674 euros cada um, os neerlandeses 2551, os suecos 889, os gregos 814, os finlandeses 653 e os espanhóis uns “escassos” 435 euros. Note-se que não são números oficiais, antes meras estimativas feitas pelo JN a partir da informação disponível.