Associação de proprietários defende um encontro de valores nas rendas. Rita Silva, da Vida Justa, alerta para o aumento das barracas.
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O preço das casas superou recordes nos últimos 12 meses. Paralelamente, as rendas também sentem esse impacto, atingindo valores superiores ao salário médio líquido em Portugal, nomeadamente nas duas maiores cidades do país: Porto e Lisboa.
“O problema da habitação não tem solução”, considera o presidente da Associação Nacional de Proprietários (ANP), António Frias Marques. “Casa para quem precisa, a um preço que possam pagar, é impossível”, acrescenta.
“É uma ameaça à democracia”, alerta Rita Silva, economista do Vida Justa, coletivo de defesa da igualdade e justiça social que se tem batido pelos problemas de escassez de habitação. “A habitação está a ser usada pelas narrativas da extrema-direita, que vota a favor das leis que promovem o aumento dos preços e, ao mesmo tempo, culpa os imigrantes”, argumenta a economista política, lembrando que há 500 a 600 famílias a viverem em barracas e é uma situação que aumenta em concelhos da Grande Lisboa, como Almada e Loures.
“A habitação é mais importante do que a saúde neste momento”, entende Manuel Vieira, presidente da Associação de Inquilinos e Condóminos do Norte de Portugal. “O nosso mercado de habitação desconectou-se completamente do poder de compra que temos e da nossa capacidade de pagar o preço das casas”, argumenta Rita Silva.
“O país está na moda”, observa António Frias Marques. “Nós, portugueses, que temos rendimentos relativamente baixos, não podemos competir com as pessoas que nos procuram”, lembrando que há prédios inteiros vendidos a estrangeiros.
Só estrangeiro paga
O mercado imobiliário em Portugal “tornou-se transnacional, não é só para quem vive neste país”, concorda Rita Silva, notando que o preço da habitação está a aumentar consistentemente desde 2015, como comprovam os dados do Idealista. “É um processo global que tem que ver com uma enorme liquidez nos mercados, desde que tivemos juros muito baixos, depois da crise financeira internacional”, adianta. “E existe uma política deliberada, da parte dos governos que vieram a seguir, de atração desse capital global para o imobiliário e a habitação”.
“O problema aqui não é o que diz o Governo, que é preciso construir. Temos mais casas do que famílias”, atenta a economista, confrontada com as promessas do Executivo, da Oposição e de uma miríade de candidatos autárquicos de construir milhares de casas. “Não têm credibilidade, qualquer criança percebe isso”, desabafa António Frias Marques. “São apenas promessas”, aduz Rita Silva.
No entender da economista política, “já há um aumento do preço dos materiais de construção”, a reboque da “pressão” causada pelas promessas de construção. António Frias discorda, considerando que são anúncios para casas a preços acessíveis num mercado focado no luxo. “É o que se vende em Portugal”, porque os potenciais compradores são estrangeiros. Até os reclames estão em inglês”.
“É preciso uma política de habitação de regulação do mercado”, defende Rita Silva. “Primeiro, acabar com todos os programas de atração do investimento externo para o imobiliário e, depois, regular as rendas e começar a baixá-las”. Do lado dos proprietários, António Frias Marques argumenta que “deve haver um encontro” de valores, entre os preços mais baixos e os mais altos. “As rendas baixinhas devem subir, até para que as outras depois não sejam muito elevadas”, propõe. Referindo que há milhares de contratos com rendas inferiores a 100 euros, Frias Marques concretiza que “as pessoas que vão fazer um contrato novo pagam pelos outros.”