Nas últimas semanas, com os protestos dos agricultores em muitos países Europeus, multiplicaram-se as entrevistas e os artigos de opinião sobre agricultura. Não me lembro de alguma vez ter visto o setor agrícola tão presente em tudo quanto é meio de comunicação, desde os jornais e televisão até às redes sociais. Nalguns grupos de WhatsApp em que estou, por exemplo, com amigos que não têm qualquer relação com o setor, falou-se mais de agricultura do que de futebol.
Não há fome que não dê em fartura.
Quando um tema é discutido por muita gente, começam, e bem, a aparecer todo o tipo de opiniões. Nas discussões destas últimas semanas, vi várias vezes serem criticados os apoios públicos (vulgo “subsídios”) ao setor agrícola. Li e ouvi vários comentários neste sentido. “Que a maior parte do orçamento da União Europeia era usada para ajudar os agricultores”. “Que na Nova Zelândia tinham acabado com os subsídios e que a agricultura era um sucesso”. E até que “os agricultores se tinham acomodado e viviam à conta de subsídios”. Felizmente, por cada opinião mais crítica, li ou ouvi duas ou três a defender e a apoiar os agricultores.
Há quem diga que não há publicidade boa ou publicidade má, mas que há apenas publicidade. Eu não concordo, mas ainda assim acho que é melhor que se fale do setor, mesmo que as opiniões sejam muito diferentes das minhas, do que não se diga nada. Pelo menos nestas últimas semanas falou-se muito de agricultura. Os agricultores conseguiram finalmente ter a atenção dos media e abrir os telejornais em horário nobre.
Vamos por isso ao que interessa: Para que servem os apoios dados aos agricultores?
De uma forma simples, servem para cumprir alguns objetivos essenciais para a Europa em que queremos viver. O primeiro objetivo é essencialmente económico e social. A comparação com a Nova Zelândia, o tal exemplo de sucesso sem subsídios, é elucidativa. A área média das explorações na Nova Zelândia é de 270 ha. Em Portugal é de 15 ha. A idade média dos agricultores na Nova Zelândia é de 55 anos. Em Portugal é de 65 anos.
Acho que não é difícil imaginar o que aconteceria a muitos agricultores portugueses, nomeadamente os que têm pequenas explorações e os mais velhos, se não existissem apoios que permitissem fazer uma transição da agricultura tradicional e familiar, que caracteriza grande parte do nosso território, para uma agricultura mais moderna e competitiva. Teríamos um problema social grave.
O segundo objetivo está relacionado com o ambiente e com a saúde. A agricultura europeia é a mais regulamentada do mundo e a mais exigente no que diz respeito ao ambiente e à qualidade e segurança dos alimentos. É por isso que comemos frutas e legumes frescos todos os dias sem que sequer nos ocorra que possam estar contaminados, por exemplo, com resíduos de pesticidas. Muitas vezes nem nos damos ao trabalho de os lavar. E a razão é simples: é porque são mesmo seguros.
É importante passar a mensagem de forma clara. Os agricultores europeus preservam os solos. Os agricultores europeus contribuem de forma positiva para o ambiente. Os agricultores europeus são os principais responsáveis pela preservação da paisagem. Os agricultores europeus produzem alimentos seguros e saudáveis. E os agricultores
europeus colocam nas prateleiras dos supermercados produtos com uma qualidade muito elevada a preços que são acessíveis à maior parte dos consumidores.
Nada disto acontece por acaso. Acontece porque existe uma Política Agrícola Comum (a PAC) que foi criada a seguir à Segunda Guerra Mundial para evitar que houvesse fome na Europa, e que se foi adaptando ao longo das décadas para fazer da agricultura e do mundo rural o que são hoje.
A PAC tem um custo elevado? Não sei, e a resposta não é simples. Mas sei que a alternativa seria, em muitos casos, a desertificação, o abandono do mundo rural, e a importação de alimentos “de outras paragens”, onde são muitas vezes produzidos sem que exista qualquer controlo, por exemplo, no que diz respeito à aplicação de pesticidas que estão proibidos na Europa. Visto desta perspetiva, não se pode dizer que a PAC tenha um custo elevado. Custo elevado teria se não existisse.
E o que é que isto tem que ver com os meus amigos do WhatsApp que não são do setor? Tem tudo. A CONSULAI iniciou recentemente um projeto cofinanciado pela Comissão Europeia - o B-RURAL - com o objetivo de estabelecer pontos de contacto entre a realidade urbana e o mundo rural. É fundamental e urgente que o setor agrícola comunique “para fora”, ou seja, para quem não é do setor. É preciso mostrar que a agricultura evoluiu, e muito, nas últimas décadas, conseguindo garantir impactos sólidos e estáveis na paisagem, na coesão do território e no abastecimento de alimentos seguros e saudáveis a um preço acessível.
Se ainda há quem não esteja bem informado, a culpa é nossa, do setor, que nunca conseguiu passar esta mensagem de forma generalizada e sistemática aos consumidores. Se não aproveitarmos agora, que temos os holofotes todos apontados para nós, vamos perder uma oportunidade que vai levar muito tempo a repetir-se.
A iniciativa B-RURAL é promovida pela CONSULAI e cofinanciada pela Comissão Europeia. No entanto, os pontos de vista e as opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade do(s) autor(es) e não refletem necessariamente a posição da União Europeia. Nem a União Europeia nem a entidade que concede o financiamento podem ser responsabilizadas pelos pontos de vista e pelas opiniões expressas.

