Solidariedade com a luta da população contra o lítio junta mais de mil assinaturas
A associação Unidos em Defesa de Covas do Barroso anunciou, esta segunda-feira, a divulgação de um manifesto que recolheu cerca de mil assinaturas, entre as quais 115 de associações, em solidariedade com os sete anos de luta contra uma mina de lítio prevista para o concelho de Boticas.
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O documento sublinha “a resistência das populações locais contra a falsa transição verde” e foi assinado, até ao momento, por 117 coletivos e organizações nacionais e ibéricas. Entre as signatárias do “Manifesto em solidariedade com os sete anos de luta na região do Barroso”, destacam-se a QUERCUS - Associação Nacional de Conservação da Natureza; a APA - Associação Portuguesa de Antropologia; o GEOTA - Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente; a AZU - Ambiente em Zonas Uraníferas; e a ÍRIS - Associação Nacional de Ambiente.
O manifesto, disponível online, destaca os impactos ecológicos do projeto da Savannah Resources, designadamente “os elevados riscos ambientais locais e para toda a bacia hidrográfica do Douro”, onde é recolhida a água que abastece a região do Grande Porto, com cerca de um milhão de pessoas. O documento cita um estudo do professor Steven Emerman, especialista mundial em Mineração, Hidrologia e Geofísica, que alerta para os riscos associados “a uma falha catastrófica da barragem de rejeitados”, definidas como escombreiras no projeto, que fica a menos de um quilómetro do rio Covas, algo “ilegal em países como a China”. Acresce, dizem, que propõe um método de construção que é ilegal em diversos países, nomeadamente no Brasil, Chile, Peru e Equador.
Tempo de chegar ao conhecimento amplo da sociedade
Segundo os proponentes do Manifesto, ideia da livraria Gato Vadio, o processo “de sete anos de luta das populações, mas também do poder municipal”, deve “chegar agora ao conhecimento mais amplo da sociedade, no momento dramático em que o Estado português impôs uma decisão burocrática”. Uma menção à secretária de Estado da Energia, Maria João Pereira, que emitiu um despacho, publicado a 6 de dezembro em Diário da República, que autoriza a constituição de servidão administrativa, pelo prazo de um ano, o que permite à empresa Savannah aceder a terrenos privados para a prospeção de lítio. “Uma decisão antidemocrática que nos coloca em legítima defesa”, lê-se no documento viabilizado pela UDCB.
Na sequência da servidão administrativa, a Savannah Resources anunciou que iria “retomar o trabalho de campo e as perfurações necessárias” para o estudo definitivo (DFS) e o processo de conformidade ambiental. Prevendo concluir estas etapas em 2025, a empresa entrou nos terrenos nos dias seguintes, com pelo menos três máquinas em locais diferentes.
“É normal que um projeto de expansão do colonialismo liberal submeta as populações e o poder local contras as suas vontades e no coração de uma das pouquíssimas regiões da Europa onde a propriedade dos montes e das serras, das terras de pasto e do usufruto dos rios, nem é privada nem estatal, mas é propriedade coletiva do povo, uma forma de jurisdição característica do comunitarismo e mais antiga que a própria fundação de Portugal?”
Segundo os proponentes, “o paradigma do extrativismo”, dizem, “apela agora ao mantra da desmaterialização e da transição energética, para recauchutar a indústria automóvel, mineira, militar e fóssil” e acusa o “Estado e as corporações multinacionais” de se prepararem “para sacrificar mais um território, dividir para reinar e criminalizar as lutas.”
"Empresa nunca extraiu um mineral que fosse"
No manifesto, a UDCB questiona-se como “uma empresa que nunca extraiu um mineral que fosse do chão da nossa terra – aqui e em qualquer lugar do Planeta – e sem qualquer experiência em mineração, possa acabar com um dos territórios europeus com maior bio-diversidade, fruto da relação harmónica e ancestral entre os seus habitantes e os recursos naturais” e lembra uma particularidade da região, única em Portugal. “Será possível que a chamada transição verde, na fase atual de colapso produtivista, destrua uma das primeiras regiões Património Agrícola Mundial (FAO/UNESCO) da Europa, em nome do extrativismo do lítio?”
As perguntas do manifesto são respondidas no próprio documento. “Não é normal, nem racional, nem as populações querem que se torne possível o que está a acontecer na Região do Barroso, no Norte de Portugal. Nem, muito menos, é justo”, lê-se no documento, que tem cerca de 900 assinaturas individuais.
A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) viabilizou ambientalmente a exploração de lítio na mina do Barroso emitindo uma Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável condicionada em maio de 2023.