Solo, personagem principal do filme "A vida na Terra"
O solo sempre foi visto como o parente invisível da natureza: aquele do qual só nos recordamos nos aniversários e natais. Metaforicamente falando, refletimos no interesse muitas vezes inconsciente e egoísta associado a estes eventos, a visão que tínhamos do solo, tido como uma fonte de nutrientes e base para cultivo, edificações e sustentação física da vida, mas nunca como foco de preservação e atenção.
A Revolução Industrial do século XVIII e a associada intensificação das práticas agroalimentares vieram acoplar uma outra visão relevante ao papel do solo - o poder de movimentar a economia mundial. A fertilização química excessiva, o cultivo de uma única espécie sem rotatividade, a falta de cobertura do solo e o desmatamento generalizado para criação de pastagens foram e são motivados por uma produção descuidada de alimentos. No entanto, a infertilidade dos terrenos agrícolas, a desertificação e aridez exacerbadas por eventos climáticos cada vez mais extremos e frequentes, e a consciência das necessidades alimentares de uma população em expansão marcam um ponto de viragem que também olha o solo sob nova luz. As múltiplas conjugações entre fatores físicos, químicos e biológicos fazem do solo uma matriz única e singular, sendo necessário o seu conhecimento aprofundado para uma gestão adequada e tomada de decisão informada.
No sentido de dar visibilidade a esta temática, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) celebra anualmente a 5 de dezembro o Dia Mundial do Solo. O tema em foco este ano - “Cuidar dos solos: medir, monitorizar, gerir” - pretende precisamente reforçar a importância dos solos saudáveis e guiar de encontro a uma consciência do caráter finito dos mesmos. A recolha de dados relativos à constituição e atividade biológica do solo, metodologias aplicadas e histórico de intervenção humana é crucial para uma aposta cuidada na sua preservação e para uma tomada de decisão fundamentada por evidências.
Tudo isto visa uma gestão sustentável do solo e contribui para permitir a vida das gerações presentes e futuras. A temática escolhida pela FAO também visa alertar para as limitações à própria segurança alimentar quando as políticas de gestão dos solos são suportadas por práticas históricas e não por informação técnica e de monitorização a longo prazo. A realidade, tal como a conhecíamos, avista um estado limite e de viragem. Como investigadora, sinto que temos o dever profissional e cívico de transferir para a comunidade o conhecimento e as propostas de mudança por forma a abrir caminho a uma nova revolução, esta pela saúde do ambiente e pela manutenção da vida.

