O interior do país e a perceção generalizada da sua "ruralidade"
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Portugal apresenta 165 municípios e 73 freguesias classificadas como territórios do interior, o que se traduz num mapa com cerca de 80% da área territorial do país, mas onde se concentra menos de 20% da população total. Estes territórios têm enfrentado algumas ameaças que persistem “associadas à sua imagem”, nomeadamente: a presença de sistemas com baixa produtividade; grande dispersão geográfica; baixa densidade populacional; falta de especialização e internacionalização das empresas; produtos/serviços de baixo valor acrescentado; mercados internos de escala reduzida; setor industrial pouco desenvolvido; falta de desenvolvimento tecnológico, entre outras.
Este conceito conservador do interior do país, hoje também uma perceção imprecisa que o generaliza em torno de uma “ruralidade” estagnada no tempo, deve ser revisto. As regiões do interior são ecossistemas únicos detentores de um enorme potencial de desenvolvimento, por serem verdadeiros hotspots de biodiversidade; fontes privilegiadas de recursos naturais e endógenos; locais emblemáticos com um património cultural ancestral; ambientes inspiradores para o desenvolvimento e aplicação de tecnologias verdes; ambientes desafiantes para incorporar inovação e desenvolvimento tecnológico; locais com população qualificada; centros urbanos com uma base económica diversificada; eixos de articulação entre zonas rurais (mais dedicadas à agricultura e à floresta) e urbanas com a presença de serviços e empresas.
Vejamos os exemplos de Bragança, Chaves, Fundão ou Ponte de Sor, novas centralidades resultantes de uma ação concertada dos atores do território e com impacto real na economia. Reuniram massa crítica em estratégias multidisciplinares criando ecossistemas sinérgicos, potenciadores de inovação e catalisadores das regiões em que se inserem. Usufruíram do Programa de Valorização do Interior, apostaram no Ensino Superior, na investigação científica e na inovação tecnológica, e tornaram-se referências no agroalimentar, na água, no digital e na aeronáutica.
Há outros exemplos, mas todos têm em comum a aposta na cultura territorial: o território no centro do desenvolvimento e das decisões políticas, mas também da missão das instituições. Definiram estratégias capazes de concretizar potencialidades distintivas em recursos competitivos ao serviço da economia e da sociedade. Um caminho de resiliência, inspirador e que deve encontrar apoio em medidas de diferenciação positiva de estímulo à coesão territorial.