Num agosto quente, com recordes de temperatura por toda a Europa, em plena época de incêndios, num ano de seca (como começam a ser quase todos), continuamos a cultivar a ilusão de que está tudo bem e que as alterações climáticas só afetarão os nossos trisnetos. Achamos que ainda temos margem para reverter isto fazendo a reciclagem e usando lâmpadas de baixo consumo. Que é melhor não pensar muito e continuar a dar likes a influencers na praia, para nos esquecermos do apocalipse. Que mais um biquíni e um creme antiolheiras e quase nem parece que estamos a cozer.
Sendo que o mais irónico é estar tudo embrulhado no papel verde do greenwashing. A proteção do ambiente é, hoje, um dos mais eficazes pretextos para comprar e estamos permanentemente a alimentar paradoxos, tentando optar por escolhas de “consumo sustentável” (o que por si só já é uma contradição nos termos).
É comum ver nas grandes cadeias de fast fashion alguns produtos têxteis feitos a partir do aproveitamento de garrafas de plástico, como sendo uma ótima forma de proteger os oceanos, sem avisar os consumidores que todos os fiapos e microborbotos libertados nas lavagens serão mais microplásticos (impossíveis de filtrar) a desaguar no ciclo da água. Em todas as cadeias de supermercados, para evitar mistura e contaminação com as outras frutas e hortícolas, os produtos frescos de agricultura biológica (mais respeitadores da saúde dos solos, dos lençóis freáticos e dos insetos polinizadores), estão invariavelmente embalados em plástico (ainda que sejam apenas duas maçãs).
Para poupar em sacos de compras ganhámos o hábito de levar sacos de casa, sendo que para aproveitar a onda, toda a empresa, autarquia, festival e congresso passou a oferecer bolsas de pano com logótipo, numa avalancha de desperdício têxtil que faz com tenhamos dezenas de shoper bags em casa.
A lista podia continuar, mas ainda mais preocupante do que isso é quando esta mesma lógica chega à gestão do território e às políticas locais. Quando se licencia a implantação de resorts em zonas dunares, com a desculpa que será em ecoconstrução. Quando se permite a “plastificação” de áreas extensas de parque natural com estufas porque é de agricultura “sustentável”. Quando se procede à reflorestação de áreas ardidas, mas com espécies invasoras e de grande consumo de água. Ou como agora, em Sines, em que a EDP foi autorizada pelo Estado a abater 1800 sobreiros centenários, para construção de um parque eólico.
Dizem os pragmáticos que “a política é a arte do possível” e sei que o equilíbrio entre economia e bem comum tende a pender para os interesses, mas quero deixar aqui escrito que o negócio disfarçado de ecologia é um dos mais perversos perigos do nosso tempo. É como a fábula do lobo em pele de cordeiro, sendo que os caninos já estão no nosso pescoço e com a temperatura a subir, o assado promete ser célere.

