Nem a zanga com o irmão impediu Élvio Sousa de fazer do JPP a terceira força na Madeira
Tem 50 anos, trabalhou como arqueólogo e é uma das figuras do Juntos Pelo Povo (JPP), o partido que, com cinco eleitos, se tornou a terceira força na Madeira, à frente do Chega. Nem a zanga de Élvio Sousa com o irmão Filipe – ex-líder do partido – impediu o JPP de ser um dos vencedores da noite eleitoral.
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“Este é um momento histórico”, afirmou Élvio Sousa, secretário-geral do JPP, em reação aos resultados de domingo. Lembrando que Miguel Albuquerque, presidente do Governo Regional, tinha dito que se demitiria caso falhasse a maioria absoluta, não perdeu tempo a cobrar a promessa: “Esperamos que se demita e que dê, pela primeira vez, o Governo da Madeira à Oposição”, atirou. Albuquerque recusou sair.
Élvio é uma das figuras de um partido que, desde 2009 – então ainda movimento – surgiu em Santa Cruz, no extremo oriental da ilha da Madeira, determinado a combater o PSD no plano autárquico. Élvio tornou-se presidente da Junta de Freguesia de Gaula logo nesse ano e o irmão, Filipe, venceria mais tarde as eleições para a Câmara de Santa Cruz.
O facto de o JPP controlar, neste momento, o município de Santa Cruz e as suas cinco freguesias fez surgir comparações entre o partido e os “irredutíveis gauleses” da aldeia de Astérix: tal como o herói de banda desenhada que resistia, “ainda e sempre, ao invasor”, também o JPP colheu os louros do feito de ter conseguido tornar-se num raro grão na engrenagem do quase cinquentenário poder do PSD na Madeira.
Desavença sobre lugares na lista dita saída do irmão
No entanto, recentemente, o JPP sofreu um abalo vindo de onde menos se esperava: Élvio e Filipe, os irmãos que desafiaram, juntos, a hegemonia social-democrata, zangaram-se e afastaram-se. Na origem da desavença terá estado o facto de o grupo parlamentar ter proposto que o nome de Filipe estivesse em quinto lugar na lista ao Parlamento regional.
Em consequência, Filipe Sousa demitiu-se da presidência do JPP em julho. Miguel Alves, um vogal da direção que saiu com ele, falou em “traição” e acusou o grupo parlamentar de querer tomar o partido “de assalto”.
O PSD apressou-se a explorar este caso. Élvio não o desmente, tendo admitido, em declarações à Renascença, que existiu “uma situação interna” no partido. No entanto, garante que, da sua parte, não há qualquer zanga com o irmão. Este domingo, citado pelo “Jornal da Madeira”, afirmou que Filipe não fez campanha pelo JPP por “razões que só ele sabe”.
Acusou Albuquerque de ter "horror a pobres" e de não ter "tintins"
Num arquipélago que, desde 1976, tem estado nas mãos do PSD – e, até 2019, sempre em situação de maioria absoluta -, o JPP tem procurado assumir-se como oposição sólida aos sociais-democratas. Ao longo dos anos, Élvio Sousa já acusou Miguel Albuquerque de ter “horror a pobres”, de “proteger os milionários” e – num debate em 2022 – de não ter “os tintins” para enfrentar o seu partido.
Na recente campanha eleitoral, falando dos problemas de abastecimento de água que assolavam a Madeira, insinuou que estes seriam deliberadamente provocados pelo Governo regional, de modo a afetar os municípios não liderados pelo PSD.
O JPP é visto como um partido situado entre o centro e o centro-esquerda. Num debate para as eleições legislativas de 2022, Élvio Sousa enunciou, como medidas fundamentais do seu partido, a “redução da carga fiscal” e das “gorduras do Estado”, de modo a que haja “equilíbrio orçamental”. Argumentou que, na Câmara de Santa Cruz, o JPP conseguiu cumprir esses objetivos “com eficiência” e “sem austeridade”.
Procurando capitalizar o apoio de uma população ainda marcadamente conservadora, Élvio Sousa estabelece, com alguma frequência, comparações entre o Executivo de Miguel Albuquerque e a forma de governo comunista. No início de setembro alegou que uma empresa regional do setor da banana é gerida “à maneira comunista” e, em 2022, acusou Albuquerque de liderar um Governo que “faz lembrar o regime soviético ou o de [Nicolás] Maduro na Venezuela”.
Élvio Sousa é doutor em História Regional e Local pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e investigador do CHAM – Centro de História de Aquém e de Além-Mar da Universidade Nova de Lisboa.