As trabalhadoras da Coindu, em Arcos de Valdevez, vão pendurar as batas no gradeamento, com as datas de entrada e saída daquela fábrica, e o respetivo número de colaborador, no último dia de trabalho, quinta-feira, dia 19. É a despedida, depois de duas décadas, “a fazer tudo para que a fábrica não fechasse”.
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“Na quinta-feira, o último dia, vamos pendurar as batas no final do turno (cerca das 14 horas). Vamos escrever a data de entrada e de saída, o nosso número de colaborador e vamos pendurar a bata aqui”, contou Catarina Almeida de 43 anos, à porta da Coindu, onde trabalha há quase 23, rodeada de colegas, alinhadas para a ação de despedida no dia do encerramento. “Agora já não nos podem despedir”, brincou uma.
Os cerca de 350 trabalhadores abrangidos pelo despedimento coletivo esperam que o grupo Coindu, com sede em Joane, Famalicão, pague as indemnizações, no dia 31 de dezembro. Além dos direitos, deverão receber um extra de 17 %, que foi negociado com a administração do grupo pelo Sindicato das Indistriais Metalúrgicas e Afins (SIMA).
“Na minha opinião poderíamos ter ido mais longe [do que os 17%], sou sincera. Acho que se tivéssemos feito uma greve, isto tinha tomado outras proporções e talvez tivéssemos conseguido outro valor, mas, infelizmente, nem toda a gente teve a coragem para seguir para a greve. Merecíamos mais ”, comentou Joana Amorim, trabalhadora há 10 anos na Coindu, na zona industrial de Padreiro. Uma fábrica que deixará na quinta-feira, com um olhar para um futuro diferente. “Estou a ver isto como uma oportunidade, apesar de tudo, de transformação. De me virar para outra coisa sem ser esta vertente de fábrica, mas esse é o meu ponto de vista, que não será o de muitas, até porque muita gente aqui tem muitos anos de casa. Trabalharam aqui uma vida inteira e não têm outra perspetiva de futuro”, disse.
Para todas, é tempo de incerteza, de alguma esperança e já de reviver memórias.
“Às vezes, quando falamos, conto que entrei aqui na fábrica no dia em que caíram as Torres Gémeas. No primeiro dia de trabalho, cheguei a casa e a primeira notícia que tive foi que caíram as Torres Gémeas. Ficou-me isso sempre marcado. Foi há 23 anos”, recorda Fernanda Abreu, de 48 anos.
Às portas do Natal, as trabalhadoras da Coindu mostram-se resilientes.
“Sinto o que sentem todos os colegas, temos que ir todos à luta. Tentar passar o Natal da melhor maneira. Não vai ser isto que nos vai abalar. Não nos podemos deixar ir abaixo”, comentou Mónica Barbosa, de 45 anos, 14 de Coindu.
Também Ana Cunha, de 35 e com 17 anos de casa, espera viver um Natal “como nos outros anos, com alegria, porque a família e as crianças não têm culpa do que se está a passar e depois para o ano é que vai cair a ficha e vou ver que estou desempregada”. Mesmo assim, confessa que se sente aliviada: “Por um lado, vai custar muito, mas por outro até sinto um certo alívio, porque nós vivíamos aqui um clima de muita pressão”.
O mesmo referiu Ana Patrícia de 42 anos, 20 deles dedicados à Coindu.
“A ficha só vai cair em janeiro quando começarmos a ver as crianças a ir para escola, os maridos a irem trabalhar e nós a ficarmos em casa. Aí é que vai ser. Vamos tentar dar a volta à situação, mas não vai ser fácil, porque estão muitas empresas a fechar, vai haver muito desemprego e nunca vai haver grande oferta de trabalho, mas vamos pensar positivo…”, comentou.
De entre os trabalhadores abrangidos pelo despedimento coletivo do grupo Coindu, há já quem tenha trabalho à espera. É o caso de Anabela Barreiro, de 55 anos. “Fecha-se uma porta, abre-se uma janela. Ao sair daqui já tenho trabalho, aqui em Arcos de Valdevez”, contou.
Recorde-se que o grupo Coindu, com sede em Joane, Famalicão, justificou publicamente o encerramento da fábrica de Arcos de Valdevez, com “a deterioração gradual das suas condições financeiras, fruto das condições do mercado”. “Surge na sequência de uma avaliação aprofundada das condições de mercado e das oportunidades de negócio, o que tornou insustentável a continuação da atividade desta unidade”, adiantou em comunicado a empresa, aquando do anúncio do encerramento, alegando ainda que “nos últimos anos, o setor automóvel vem a sofrer uma crescente e profunda transformação, marcada pelo declínio significativo da procura pós-pandemia e pelo aumento da pressão competitiva dos mercados com custos de mão de obra mais baixos.
No mesmo comunicado, aludiu-se à recente “entrada do Gruppo Mastrotto” no capital da empresa, que “visa estrategicamente estabilizar a situação, aumentar a competitividade da Coindu e abrir novas oportunidades internacionais”. Mantendo “as suas operações, com foco nos segmentos premium do mercado automóvel,” na fábrica de Joane.