Montenegro diz que diplomas promulgados entram "em matéria executiva" e são "deturpação"
O primeiro-ministro defendeu, esta terça-feira, que alguns dos diplomas hoje promulgados pelo presidente da República entram em "matéria de ação executiva", e constituem "uma deturpação do normal funcionamento".
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O presidente da República promulgou hoje sete decretos do parlamento sobre IRS, incluindo redução de taxas, IVA da eletricidade e eliminação de portagens, cinco dos quais aprovados pela oposição, com votos contra de PSD e CDS-PP.
Numa reação à comunicação social, em Luanda, à margem da visita oficial de três dias que está a realizar a Angola, Luís Montenegro foi questionado se esta decisão de Marcelo Rebelo de Sousa complica a ação do Governo que lidera.
"Não, a decisão sobretudo da Assembleia da República de se substituir ao Governo, em matérias que são claramente de ação executiva - como sejam a determinação da política fiscal, como sejam a cobrança ou não de portagens em autoestradas - é que francamente me parece uma deturpação daquilo que é o normal funcionamento", disse.
Questionado se, com esta promulgação, Marcelo Rebelo de Sousa discorda desta visão, Montenegro considerou que "são duas coisas completamente diferentes".
"O presidente da República recebeu uma lei da Assembleia da República, aliás, um decreto da Assembleia da República. Eu não estou a dizer que não é possível aprovar as leis: uma coisa é a possibilidade de asleis serem aprovadas, outra coisa é a assunção por parte dos partidos que estão na oposição de querem governar em vez do Governo. São coisas completamente diferentes", disse.
Luís Montenegro defendeu que alguns dos diplomas hoje promulgados, como a baixa do IRS nos moldes aprovados, a diminuição do IVA sobre a eletricidade e a eliminação do pagamento de portagens "têm consequências financeiras que têm um reverso da medalha"
"O que é que nós vamos deixar de poder fazer em função dessas decisões da Assembleia da República. Nós agora faremos a nossa avaliação, naquilo que tem a ver com o próximo ano, inevitavelmente essa avaliação terá de se enquadrar também na própria formulação do Orçamento do Estado, porque as forças políticas que aprovaram estas medidas, seguramente, quererão que elas se materializem no orçamento", disse.
O primeiro-ministro salientou que o Governo PSD/CDS-PP pretendia uma descida do IRS "centrada sobretudo na classe média, para compensar aquela que já tinha sido feita na aprovação do Orçamento do Estado para 2024". "Aquilo que estes partidos pretenderam foi agravar essa injustiça que, do nosso ponto de vista, está no Orçamento", considerou.
Montenegro disse respeitar a decisão e pediu ao PS e Chega uma clarificação sobre o momento de aplicação do diploma que baixa as taxas do IRS.
Em declarações aos jornalistas, em Luanda, antes de uma receção à comunidade portuguesa, Luís Montenegro não esclareceu se o Governo irá já alterar as tabelas do IRS de modo a que a baixa aprovada no parlamento tenha efeitos ainda este ano.
"Antes de mais nada, é preciso perceber se é mesmo a intenção da Assembleia da República que se faça a alteração das tabelas de retenção na fonte do IRS já a partir de agora. O Governo estará disponível para o fazer", afirmou.
No entanto, avisou, que "as decisões têm consequências". "Uma coisa é nós decidirmos alguma coisa do ponto de vista fiscal, cuja consequência se repercute no próximo ano. Outra coisa é fazê-lo com repercussões imediatas. Eu gostava de saber se, em particular, o Partido Socialista e o Chega, que foram as forças políticas determinantes para a aprovação dessa diminuição, estão em condições de recomendar ao Governo que seja essa uma das consequências da aprovação e promulgação", disse.
Questionado se esta decisão de Marcelo Rebelo de Sousa representa uma derrota do Governo, respondeu: "Isso são considerações que não se colocam quando o presidente da República tem as suas competências, nem há vitórias, nem há derrotas".
O primeiro-ministro começou por dizer que respeita a decisão quer do presidente da República, quer da Assembleia da República, lembrando que alguns dos diplomas hoje promulgados têm origem no Governo, outros no parlamento.
Já quanto às consequências da promulgação, o primeiro-ministro considerou que "elas são referidas pelo próprio presidente, quando anota que há consequências do ponto de vista da política orçamental para o próximo ano e, eventualmente, já para o ano em curso".
Questionado se, com esta decisão, o presidente da República não está a lançar um repto ao Governo e ao PS para que se entendam nestas matérias, Montenegro salientou que o executivo já falou uma primeira vez com os partidos da oposição todos, na passada sexta-feira. "O Governo está a elaborar o Orçamento do Estado e o Orçamento do Estado tem uma fase para ser discutido, apresentado, dentro do Governo e, eventualmente, também com alguns partidos ou todos os partidos da oposição. Não vamos fazer, em julho, a discussão que o parlamento há de fazer em outubro e novembro.
Montenegro admitiu, contudo, que esta decisão poderá condicionar a preparação do documento. "Estas escolhas não são escolhas indiferentes, não são escolhas inconsequentes (...) É preciso que todas essas receitas que deixam de ser arrecadadas possam ser ou substituídas por outras receitas ou então possam corresponder a um corte nas despesas", afirmou.
À pergunta sobre o que pretende fazer o Governo neste capítulo, limitou-se a insistir na responsabilidade dos partidos da oposição: "O Governo vai apresentar um Orçamento. Mas aquilo que é interessante para o país é que quem promoveu estas alterações deva dizer ao país o que é que oferece em troca".