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Os cartazes da “Guerra das estrelas” para os mais velhos, os do primeiro filme do “Harry Potter” para os mais novos – e tantos outros de permeio, como os de “A coisa”, “Regresso ao futuro”, “Os condenados de Shawshank”, “ET – O extraterrestre” e até “Os Goonies”.
Quem não está por dentro do segredo vê-os como grandes composições narrativas que são como trailers estáticos, num relance de espanto contam uma história incompleta. Melhor, transmitem a sensação de uma história por descobrir. E têm algo de grandioso e operático, simultaneamente infantil. Quer dizer que esses cartazes desenraízam em nós uma coisa parecida com a esperança: de quê, digo mais à frente.
Já os viram. Mas agora observem-nos melhor, de mais perto – é o segredo. Talvez se espantem, como eu me espantei, por descobrir que não são composições fotográficas. Tratam-se de pinturas. E embora seja possível detectar o traço do pincel, do lápis e a mancha do “spray”, a técnica é tão extraordinariamente precisa e realista que duvidamos. Ainda mais hoje em dia, em plena incerteza sobre o que é verdadeiro por causa da inteligência artificial.
Mas eu garanto: todos esses cartazes nasceram da inteligência artística e do brilhantismo técnico do pintor Drew Struzan. A julgar por um documentário de 2013, o homem tinha o ar bondoso, e a fala mansa – quase ingénua –, de quem conseguiu uma espécie de “jackpot”: o dom do carácter e o dom da pintura. Não é coisa pouca.
Bom carácter e boa inocência não fazem boa arte, evidentemente. Mas o caso de Drew Struzan encontra-se na “goldilock zone”, aquela zona rara que os astrofísicos dizem ser ideal para a vida. Nem demasiado perto nem demasiado longe do Sol. A sua expressão artística evoca um tipo de emoção muito vendável: a luz e a sombra, a bondade e a maldade – tudo isso encontramos nos filmes que os cartazes de Drew Struzan promovem.
É verdade que são um tanto série B. Mas só um tanto, porque são de primeiríssima água. Sentimos sempre que o artista encontrou a melhor maneira de se proteger, já que a qualidade, a grande qualidade técnica podia ser um grande defeito artístico. É que os cartazes evocam uma estranha nostalgia do que acaba de acontecer. Até do que ainda não aconteceu. Talvez seja isto: evocam a nostalgia da esperança.
Entretanto a IA faz igual, outros igual fizeram, e outros preferem sensaborias fotográficas que são meros “frames” dos filmes. É aliás o que basta para as sequelas infindáveis e as adaptações insuportáveis para acção real. Mas aqui e ali ainda há filmes que bem mereciam o pincel de Drew Struzan.
O autor escreve segundo a antiga ortografia