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Nos idos de maio de 2014, na sequência de umas eleições europeias, surgiu uma nova expressão no jargão político: a “vitória poucochinha”. Foi o ponto de partida para a operação com que António Costa viria a derrubar António José Seguro da liderança do PS. Mas não seria a última vitória eleitoral com essas características. O próprio Costa se encarregou de transformar a “vitória poucochinha” de Passos Coelho, nas legislativas de 2015, numa “geringonça” que, contra todas as probabilidades, durou os quatro anos (a última vez que os portugueses testemunharam uma legislatura completa). Costa continuou a faturar, primeiro com sua própria “vitória poucochinha” (2019) e depois com uma maioria absoluta. Que lhe serviu de pouco, uma vez que se foi diluindo entre escândalos sérios e casos de mercearia e traficância partidária, acabando por implodir com o empurrão grosseiro do Ministério Público, numa daquelas operações em que a montanha acaba a parir um rato. O resultado dessa combinação político-judicial foi um “empate” nas eleições de 2024 e um terramoto vindo da Direita extrema. Depois de novo turbilhão, agora em volta dos negócios e da ética do primeiro-ministro seguinte, vieram as eleições de domingo passado e, com elas, a confirmação de que a extrema-direita veio para ficar (é eficaz a mobilizar o descontentamento com recurso ao catálogo de medos, mentiras, racismo e teorias da conspiração que importa de fora, sem pagar tarifas) e o regresso da “vitória poucochinha”. O que fará com ela Luís Montenegro é um capítulo por escrever. Fazer prognósticos na política portuguesa é inútil, como ficou amplamente provado nos últimos anos. Com a devida reserva, o melhor que se pode dizer é que teremos Governo até meados do próximo ano, mais por imperativo constitucional do que por desejo de estabilidade. E que até lá teremos a provável irrupção da extrema-direita no Poder Local, um PS a aceitar qualquer Orçamento do Estado que lhe ponham à frente, e finalmente, um novo presidente da República. E então veremos quem dará ordem de marcha e em que direção.