Israel lançou a destruição no Líbano esta semana, numa marcação cerrada aos redutos do grupo xiita Hezbollah. Saiba quem são e que armas possuem no seu arsenal.
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O Hezbollah é um grupo militante muçulmano xiita formado na década de 1980, durante o caos da longa guerra civil do Líbano. Foi criado sob orientação iraniana para combater a ocupação israelita do sul do Líbano, que terminou em 2000. O nome significa "Partido de Deus", em árabe.
O movimento tornou-se uma poderosa força política e de combate no Líbano e expandiu as operações na Síria, Iraque, Iémen e outros locais do Médio Oriente. Possui uma extensa infraestrutura no Líbano para apoiar a sua missão. Nas eleições de 2022, o Hezbollah e os seus aliados políticos perderam a maioria no Parlamento, mas o grupo continua poderoso e controla partes do país, incluindo o sul, fronteira com o norte de Israel.
Quem apoia o Hezbollah?
O Hezbollah foi formado com o apoio do Irão e mantém estreitos laços financeiros, espirituais e militares com Teerão. Faz parte daquilo a que o Irão chama o "Eixo da Resistência", uma rede de forças anti-Israel que inclui o Hamas em Gaza e os Houthis no Iémen. O movimento libanês é amplamente visto entre os analistas como o mais poderoso e influente dos grupos iranianos e representa a mais grave ameaça militar para Israel.
Quem comanda o Hezbollah?
Desde 1992 que o Hezbollah é liderado por Hassan Nasrallah, um clérigo que raramente faz aparições públicas com medo de ser assassinado. Substituiu o cofundador e anterior líder do grupo, Abbas al-Musawi, depois de Israel o ter matado.
Dois dos principais comandantes do grupo morreram num ataque aéreo israelita em Beirute, na semana passada: Ibrahim Aqeel e Ahmed Wahbi.
A que se deve este conflito?
Há quase um ano que o grupo xiita tem como alvo o norte de Israel, em solidariedade com o Hamas - o grupo palestiniano que liderou os ataques a 7 de Outubro, desencadeando uma nova guerra em Gaza.
Israel e o Hezbollah têm trocado tiros desde então, calibrando as suas respostas para evitar escaladas para uma guerra total. Neste momento, os dois países estão em vias de passar essa linha. Em 2006, uma invasão terrestre de Israel, que durou 34 dias, matou mais de mil libaneses e 150 israelitas. A letalidade dos ataques israelitas desta semana já ultrapassou a desse conflito.
O objetivo de Israel seria persuadir o Hazbollah a recuar na fronteira, mas os intensos bombardeamentos tiveram precisamente o efeito oposto. Os líderes do movimento disseram que vão continuar os ataques até ser acordado um cessar-fogo em Gaza.
Qual a força de cada lado?
Embora a capacidade militar do Hezbollah não possa ser comparada com a de Israel, não é por isso um adversário inferior. Os dados sobre o arsenal do movimento são incompletos e, por vezes, conflituosos, com origem nos Estados Unidos, um aliado de Israel. No entanto, esta é considerada uma das forças não estatais mais bem armadas do mundo, com o apoio do Irão e da Síria. Depois de uma guerra extremamente destrutiva, os líderes do Hezbollah passaram anos a desenvolver capacidade militar numa tentativa de combater e dissuadir os ataques israelitas.
O Hezbollah conta com mísseis de médio e longo alcance, capazes de atingir todo o território israelita, se conseguirem contornar as defesas antiaéreas. Na quarta-feira, atacaram Telavive com a sede da Mossad - os serviços secretos israelitas - na mira. O grupo lançou mais de 100 mísseis, rockets e drones contra Israel desde domingo, a maioria dos quais foram intercetados.
Israel tem um dos exércitos mais sofisticados do mundo, possuindo até armas nucleares no seu arsenal. Dos quase 10 milhões de habitantes, quase 170 mil são militares ativos. A estes juntam-se mais 465 mil reservistas que podem ser convocados para a guerra a qualquer momento, dos quais 360 mil já o foram desde o início do conflito em outubro.
No início deste mês, as forças especiais israelitas realizaram um ataque com forças especiais que destruiu uma instalação de produção de mísseis do Hezbollah na vizinha Síria, segundo responsáveis norte-americanos e ocidentais.
Um exército de guerrilha
Hassan Nasrallah disse, recentemente, que o Hezbollah tinha chegado aos 100 mil combatentes - um valor que os governos ocidentais acreditam ser, na realidade, menos de metade.
Segundo um relatório do Centro de Estudos Estratégicos Internacionais (CSIS, na sigla em inglês), baseado nos Estados Unidos, o grupo "conta com uns 30 mil combatentes em atividade e até 20 mil de reserva, e as suas forças consistem principalmente em infantaria ligeira, historicamente treinada para o sigilo, a mobilidade e a autonomia".
A organização cita um exemplo de tática que remete para a última grande invasão israelita do Líbano, em 2006: "As unidades de rockets [da milícia] foram concebidas para estabelecer um ponto de lançamento, disparar e dispersar em menos de 28 segundos, recorrendo a equipamento preposicionado, refúgios subterrâneos e bicicletas de montanha".
Os combatentes têm uma longa experiência de guerrilha e no combate urbano. Segundo o CSIS, a luta em apoio a Bashar al-Assad na Síria, durante a última década, conferiu-lhes capacidades e competências dos exércitos convencionais.
Contudo, o Hezbollah tem perdido comandantes e centenas de militantes desde outubro do ano passado, quando começou os ataques de baixa intensidade contra Israel em apoio ao Hamas. A estes somam-se mais 1500 feridos resultantes dos ataques com "pagers" e "walkie-talkies" na semana passada, segundo revelou uma fonte do grupo à agência Reuters. Ainda assim, em caso de guerra total, esta milícia seria "um inimigo formidável", garante o centro de estudos norte-americano, citado pelo diário espanhol El País.
Rockets, mísseis, tanques e drones
O Hezbollah possui, segundo cálculos que divergem, entre 120 mil a 200 mil rockets e mísseis. A maior parte são pequenos rockets de artilharia, não guiados, e que se transportam facilmente - dos quais se destacam os Katyusha, profusamente usados na guerra em 2006 e fornecidos principalmente pelo Irão.
Mas desde a última guerra aberta entre os dois países, o Hezbollah aumentou consideravelmente o armamento de mísseis de longo alcance, que podem ser disparados até 500 quilómetros - sensivelmente a distância de norte a sul de Israel. Apenas algumas centenas destes mísseis serão guiadas. No entanto, a precisão destas armas proporciona ao grupo xiita a capacidade de atacar alvos de grande valor e infraestruturas críticas e vitais de Israel.
A milícia também terá adquirido tanques de fabrico russo, como os T-72, devido à sua participação na guerra na Síria. Contudo, não é claro se têm formação para os manusear e reparar. Além disso, os tanques seriam alvos fáceis para os sofisticados aviões de combate e drones israelitas.
O Irão é o fornecedor do grande grosso dos aparelhos não tripulados usados pelo Hezbollah, como os Ayoub (Shahed-129), Mirsad 1 e 2, Karrar, entre outros. O grupo possui drones comercias de quatro hélices (quadricópteros) e drones de vigilância e ataque. Os operadores destes aparelhos terão sido treinados pela Força Quds, uma unidade especial da Guarda Revolucionária do Irão.
Defesa antitanque e antiaérea
O grupo também usa mísseis antitanque, apelidados de Thar Allah, especificamente desenhados para superar o sistema de proteção dos tanques israelitas Merkava, segundo noticiou, em outubro do ano passado, a estação televisiva libanesa Al Mayadeen. Desconhece-se a sua eficácia.
De acordo com o relatório do CSIS, também foram instalados mísseis antitanque Kornet em veículos de todo o terreno. Desde 2006, o Hezbollah recebeu, do Irão e da Rússia, canhões antiaéreos, sistemas portáteis de defesa aérea e sistemas de mísseis de curto e médio alcance.
Nenhuma destas armas faz frente à superioridade do armamento israelita, que dispõe até de cerca de 30 caças de combate F-35 de última geração.
Uma rede de túneis nas montanhas
Os combatentes do Hezbollah libanês tiram partido da orografia que os rodeia, as colinas rochosas do sul do Líbano. Neste terreno montanhoso, qualquer força militar israelita pesada que se pretenda movimentar na região será obrigada a recorrer às compactas estradas principais, ficando vulnerável a emboscadas do inimigo, segundo antecipa o relatório do CSIS.
Tal como fez o Hamas na Faixa de Gaza, o Hezbollah construiu uma rede de túneis e bunkers nestas colinas, que se suspeita ser usada para lançar ataques de rockets e esconder mísseis balísticos. O Irão e a Coreia do Norte terão ajudado a construir esta rede após a invasão israelita de 2006, segundo um relatório da Alma, um instituto israelita especializado na milícia xiita libanesa, citado pela Reuters.