O primeiro Pontal do primeiro-ministro Luís Montenegro legendou um momento muito esperado pelas hostes sociais-democratas, outrora demasiado veraneantes no que toca a pedir. A consagração de um responsável governativo em palanque era algo impensável no ano passado, quando Montenegro se apresentou na festa da rentrée social-democrata como presidente do partido, envolto na defesa da teoria geral da política civil de que o “país está a falhar” e a precisar de um “sobressalto cívico, político e empresarial”. Entretanto, o sobressalto chegou em Novembro como um Diabo que nunca antes havia aparecido, também antes do ano 24 onde o PS poderia “despejar” dinheiro na economia dos bolsos de todos. Parece que um novo Pontal nasceu num novo país. Se, no ano passado, Luís Montenegro parecia lutar com um país inatingível, com um presidente apreensivo e contra os dislates e a ambição interna de Passos Coelho, hoje é um primeiro-ministro que aparece confortável, calmo e sobrevoador, sabendo que excedeu as expectativas de muitos.
A antecipação do futuro do Orçamento de Estado para 2025 (OE25) não foi sequer à bola de cristal algarvia. Nenhum drama, nenhum problema. O problema, qual bota a descalçar, parece ser mesmo do PS. Os 80 deputados que seguram a minoria governativa não chegam para a luz verde e, se a extrema-direita não votar a favor, caberá a Pedro Nuno Santos abster-se em sede de votação. O líder socialista rejeita a pressão, que considera inaceitável por estar na oposição e, como tal, ter o poder mas não o dever. Enquanto assegura esperar pelas contas que pediu em Julho, sem reuniões marcadas com o Governo e com o ministro da Finanças a avisar que a margem para negociação é curta, Pedro Nuno Santos terá muito que negociar mas dentro do partido. Não há outra solução para o actual momento de incubação de liderança no PS. Álvaro Beleza, mandatário da campanha do líder socialista, defende que o PS deve aprovar o OE25 sem negociar medidas, o que pode ser interpretado como tensão interna mas, acima de tudo, como a passadeira que se começa a estender para a postura de indiferença socialista que viabilize o Orçamento.
Era desnecessário que Hugo Soares nos lembrasse um primeiro-ministro-talismã nas Olimpíadas. Sem OE25 no discurso do Pontal, Montenegro atirou medidas simples, eleitorais não vá o diabo tecê-las, panfletárias, nada estruturais mas de fácil percepção e entendimento. Passes para comboios, cheques suplementares a pensionistas e mais cursos de Medicina não apagam o caos nas urgências da saúde e o sentimento de tolerância zero para o esvaziamento do SNS, mas são medalhas que Luís Montenegro nunca pensou colocar ao peito.
*O autor escreve segundo a antiga ortografia

