Os irmãos Saïd e Chérif Kouachi, presumíveis autores materiais do atentado ao semanário satírico Charlie Hebdo esta sexta-feira mortos em França, foram recrutados nos anos 2000 no centro de Paris.
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Também morto, esta sexta-feira, pelas forças de elite francesas, Amedy Coulibaly, de 32 anos, um criminoso reincidente que sequestrou várias pessoas num supermercado kosher (judaico) parisiense, era um velho conhecido dos irmãos Kouachi. Sobre a mulher Hayat Boumeddiene ainda não há informações.
O mais velho dos irmãos Kouachi, Saïd, de 34 anos, recebeu treino de manuseamento de armas em instalações da organização terrorista al-Qaeda no Iémen, ao passo que o mais novo, Chérif, de 32, não conseguiu juntar-se às fileiras da jiad no Iraque, tendo sido condenado a uma pena de prisão de três anos em 2008, altura em que era já bem conhecido dos serviços antiterroristas franceses.
Os dois irmãos estavam também "há anos" na lista negra norte-americana do terrorismo.
Coulibaly tinha sido condenado pelo plano de evasão de um outro presumível jiadista, Smaïn Ait Ali Belkacem, em 2010, um caso em que Chérif Kouachi tinha ele próprio sido indiciado, antes de beneficiar de um arquivamento.
Smaïn Ait Ali Belkacem foi condenado em novembro de 2002 a prisão perpétua pela sua participação no atentado da estação RER Museu d'Orsay, em outubro de 1995.
O ministério público de Paris tinha pedido três anos de prisão para Amedy Coulibaly em novembro de 2013 "por ter elaborado um plano de fuga e um atentado de grande escala", indicaram testemunhas da época e ele acabou por ser condenado, em dezembro de 2013, a cinco anos de prisão efetiva.
A investigação então realizada orientou os polícias na direção de um grupo de indivíduos - entre os quais Coulibaly - todos com o mesmo perfil: já condenados por delitos comuns e que se terão radicalizado na prisão, em contacto com islamitas radicais.
Em 2010, Amedy Coulibaly atravessava igualmente problemas familiares, desaprovando "os atos de infiéis" dos pais e expressando a grande importância que tinha, para si, a religião.
Agora, era também procurado pelo assassínio de uma agente policial em Montrouge, do qual já tinha sido formalmente acusado.
Um especialista em criminologia interroga-se sobre se o homicídio de Montrouge e o sequestro no supermercado não terão sido manobras de diversão para facilitar a fuga dos irmãos Kouachi, ou se é possível que o homem tenha agido por mimetismo, após a mediatização do massacre ocorrido na quarta-feira na redação do semanário satírico Charlie Hebdo.
A investigação sobre o recrutamento, nos anos 2000, de jiadistas para o Iraque, na qual Chérif Kouachi estava envolvido, traça o perfil de um jovem movido, segundo testemunhos, pela "ira contra os infiéis" e que manifestava já vontade de agir em França.
Mas os seus vizinhos em Genneviliers, no noroeste de Paris, onde residia com a mulher -- sempre integralmente coberta -- descrevem um homem "prestável" e "bem-educado".
Na mesquita Ennour, na cidade, onde Chérif Kouachi ia às vezes rezar às sextas-feiras, o presidente da associação da mesquita, Mohammed Benali, garante que ele não apresentava "qualquer sinal de radicalização".
Chérif tinha, no entanto, dado que falar "antes das presidenciais" de 2012, quando o imã pediu aos fiéis que fossem votar, segundo Benali.
"Ele não estava de acordo, abandonou a oração e as forças da ordem intervieram para o acalmar", relatou.
Quanto ao seu irmão mais velho, Saïd, é mais discreto, mas viajou para o Iémen em 2011, onde recebeu treino de manuseamento de armas, de acordo com um responsável norte-americano que falou a coberto do anonimato.
Franceses de origem argelina, Chérif e Saïd, órfãos, cresceram num centro educativo do centro de França, em Treignac.
Patrick Fournier, um dos responsáveis do estabelecimento de ensino, descreveu-os como "perfeitamente integrados" e "nunca tendo colocado problemas de comportamento" durante a sua estada.
No início da década de 2000, Chérif começou a frequentar as aulas corânicas de um jovem "emir", Farid Benyettou, em residências particulares ou numa mesquita do bairro popular parisiense de Stalingrad. Um encontro aparentemente seminal, já que ele tinha, até então, a ideia de "não ser um bom muçulmano", fumando ocasionalmente canábis, segundo uma fonte próxima do caso.