Os 36 drones comprados pelo Exército há dois anos nunca foram usados para detetar fogos, apesar de ter sido essa umas das justificações para o investimento de 5,8 milhões de euros, na senda das tragédias de 2017.
Desde agosto de 2018, e com um último drone chegado da América há cerca de 10 dias, nunca a Proteção Civil, a GNR ou o ICNF os pediram. Nem a estratégia anual de combate a fogos (DECIR) deste ano os prevê. O Governo vai desembolsar 4,5 milhões de euros a comprar mais 12 drones, que ficarão nas mãos da Força Aérea (FAP).
Aquando da aquisição dos drones à AeroVironment, via NSPA - a central de compras da NATO -, em dezembro de 2017, foi assumido que a principal missão dos veículos aéreos não tripulados seria a deteção de incêndios. Ao JN, o Exército explicou que em causa estão 12 sistemas, cada um composto por três aeronaves e com um raio de ação de 10 quilómetros a partir da antena de controlo, que "estão a ser utilizados em operações militares, no apoio de missões de vigilância e reconhecimento, além do normal processo de formação e treino".
Desde então, os drones "não foram solicitados" pela Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), que dispõe os meios no terreno, ou pelos Sapadores Florestais e postos de vigia do Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF).
"Necessidade urgente"
Também o Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, a polícia ambiental, e a Unidade de Emergência de Proteção e Socorro (UEPS) da GNR, que combate fogos e fiscaliza áreas florestais, não os pediram. A UEPS conta com 11 drones - mais fracos - dos quais três estão avariados, apurou o JN.
Na justificação da nova compra, há duas semanas, o Governo invocou a "necessidade urgente de vigilância aérea adicional".
Na resolução - publicada em "Diário da República" a 18 de maio - lê-se que a despesa será assumida pelo Fundo Ambiental e que a Força Aérea terá de coordenar o uso dos meios com a GNR, para ações de vigilância, e com a ANEPC, "no quadro do combate a incêndios". Entre maio e outubro, a FAP terá ainda de ceder 300 horas de voo às autoridades do setor ambiental.
Questionados pelo JN, os ministérios do Ambiente e o da Defesa, a GNR e o ICNF não se pronunciaram. Só a Proteção Civil explicou que a compra resulta "de um processo de decisão participado e partilhado entre as entidades que integram o sistema de gestão integrada de fogos rurais", que "levou em conta a prioridade, já apontada no passado, de robustecer" o comando e a vigilância.
O ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, revelou há duas semanas que os novos drones terão de percorrer uma área de 100 quilómetros, sem adiantar a quem serão adjudicados.
Ao JN, Paulo Pinto, dirigente da Associação dos Profissionais da Guarda (APG/GNR), disse ser "lamentável que o Fundo Ambiental não pague drones para a polícia ambiental, que é o SEPNA, ou para o seu braço operacional, a UEPS". "No limite, até pode haver uma ilegalidade. Ficamos perplexos", admitiu.
O antigo delegado da Proteção Civil de Leiria e atual consultor do setor, António Morais apontou baterias à ANEPC, por "não compreender o seu papel de charneira e agregador e manter um presidente que entra mudo e sai calado".
Carlos Silva, da Fénix - Associação Nacional de Bombeiros e Agentes da Proteção Civil, alinha nas críticas: a "proteção civil e socorro do país está a ser liderada por pessoas que não conhecem o sistema e que não têm histórico no sistema". Outras fontes do setor mostraram surpresa por este recurso nunca ter sido utilizado e apontam o dedo ao comandante operacional nacional, Duarte da Costa.
5,8 milhões de euros (valor sem IVA) foram aplicados pelo Exército, no final de 2017, na aquisição de 36 veículos não tripulados. A compra foi feita à empresa americana AeroVironment, através da central de compras da NATO. Começaram a chegar em 2018. O último foi entregue há 10 dias.
4,5 milhões de euros é a verba que vai ser assumida pelo Fundo Ambiental, tutelado pelo Ministério do Ambiente, na compra de 12 drones que serão entregues à Força Área. O anúncio foi feito a 11 de maio e sete dias depois saiu a autorização da despesa em "Diário da República".