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Governo falha quase todas as metas para inclusão de deficientes

Desemprego de pessoas com deficiência é mais alto do que nunca Álvaro Isidoro / Global Imagens

Medidas de 2021 por cumprir: barreiras estão por eliminar, acesso ao emprego está igual e a comissão não se reuniu este ano. Ministério diz que tempo não foi suficiente.

A Estratégia Nacional para a Inclusão das Pessoas com Deficiência (ENIPD) falhou quase todas as metas propostas para 2021. As barreiras arquitetónicas estão por eliminar, os guias para a prevenção da violência não existem e nem o diagnóstico sobre a empregabilidade foi feito, numa altura em que o desemprego de pessoas com deficiência é mais alto do que nunca. A Comissão de Políticas de Inclusão das Pessoas com Deficiência, liderada pela secretária de Estado, ainda não se reuniu em 2022.

A ENIPD entrou em vigor há um ano, a 1 de setembro, e contém 170 medidas concretas para implementar até 2025, das quais cerca de 70 deviam ter sido concluídas ou iniciadas em 2021. Mas a esmagadora maioria falhou.

É "com muita preocupação" que o presidente da Confederação Nacional de Organizações de Pessoas com Deficiência (CNOD), José Reis, vê o "atraso enorme" na implementação desta estratégia. "A questão das acessibilidades é importante", avisa. Neste capítulo, a ENIPD previa que se estabelecessem 30 parcerias com municípios para a eliminação de barreiras arquitetónicas no espaço público, mas o objetivo não foi atingido e apenas foi assinado um protocolo em julho último.

Na área cultural, em 2021 também deviam ter sido criados 20 planos de acessibilidade a monumentos, museus e palácios. Ficou ainda por lançar o programa Eventos Acessíveis e o prémio Evento + Acessível.

Ministério admite atraso

Ao JN, o Ministério da Segurança Social justifica que algumas medidas são "inovadoras" e, por isso, foi preciso construir "uma base de suporte técnico" ou incluí-las nos planos de atividades das organizações envolvidas. Por esse facto, admite, "não foi possível efetivar para 2021" a conclusão ou início de "algumas medidas, face à data de aprovação da reunião do Conselho de Ministros". Ou seja, "o intervalo de tempo entre a conclusão do circuito legislativo e as respetivas aprovação e publicação" da ENIPD "conduziu à necessidade de realizar ajustes na calendarização", refere o Ministério.

As organizações ligadas ao setor estão descontentes e apontam outras causas. "Para implementar uma estratégia tem de haver uma dotação orçamental e não existe. O nosso Orçamento do Estado não contempla a estratégia", revela Gisela Valente, da Associação Portuguesa de Deficientes (APD), que lamenta o incumprimento: "Não temos conhecimento de nada feito até ao fim de 2021".

A APD defende a importância da publicação dos guias para prevenir, sinalizar e intervir em situações de risco ou violência sobre pessoas com deficiência, previstos na ENIPD. Estes guias deviam ter sido entregues às forças de segurança, magistrados, profissionais de Educação, Saúde e Ação Social, mas tal não aconteceu. "É impossível dizermos que se faz só porque se escreve no papel. Não se está a fazer", acrescenta.

Numa altura em que o desemprego de pessoas com deficiência é cada vez maior (ler texto na página seguinte), as medidas da ENIPD destinadas à empregabilidade também ficaram na gaveta. Em 2021 ficou por apresentar o estudo de diagnóstico sobre a situação de empregabilidade das pessoas com deficiência.

As 30 equipas de apoio à transição entre a escolaridade obrigatória e a vida pós-escolaridade também não existem e o serviço de apoio aos empregadores privados para efeitos do cumprimento da lei das quotas ainda está por criar. Confrontado, o Ministério disse ter criado "mecanismos/documentos, tendo em vista a harmonização de procedimentos nesta área e impulsionar o cumprimento das quotas", mas não especifica quais, nem quando foram lançados.

sem reuniões em 2022

Entre as instituições é notória a desilusão com o avanço lento da ENIPD, que até consideram bem feita, mas só na teoria. Segundo José Reis, da CNOD, a Comissão de Políticas de Inclusão das Pessoas com Deficiência reuniu-se pela última vez no último trimestre de 2021 para discutir mudanças na reforma antecipada para a deficiência.

Além de ainda não se ter reunido com o novo Governo, a comissão não emitiu qualquer parecer sobre a monitorização da ENIPD, como é da sua competência legal: "Ainda não foi feita qualquer reunião este ano, estamos a aguardar". A presidente da comissão é a secretária de Estado, Ana Sofia Antunes.

60% de incapacidade para a lei reconhecer

Para que a lei reconheça a situação de deficiência a um cidadão é preciso que este tenha uma incapacidade de 60% ou mais, atestada em junta médica e comprovada por atestado multiúso.

INR coordena e também monitoriza

A entidade coordenadora da implementação da ENIPD é o Instituto Nacional para a Reabilitação (INR), sob tutela do Ministério da Segurança Social, que também monitoriza a implementação. Até 30 de março de cada ano, tem de ser publicado no site do INR um relatório de execução das medidas do ano anterior, mas tal ainda não aconteceu.

Delfim Machado