O secretário-geral da ONU, António Guterres, atualizou esta segunda-feira a proposta de orçamento regular da organização para 2026, prevendo agora cortes de 577 milhões de dólares (496,4 milhões de euros) e uma redução de 2.681 postos de trabalho.
Numa apresentação perante a Quinta Comissão da ONU, responsável por assuntos administrativos e orçamentais, Guterres propôs reduzir as necessidades de recursos das Nações Unidas para 3.238 milhões de dólares (2,79 mil milhões de euros), uma redução de 15,1% face a 2025. A tabela de pessoal foi revista para 11.594 postos de trabalho - incluindo Missões Políticas Especiais -, uma redução de 2.681 postos, ou 18,8%, em comparação com a tabela de pessoal aprovada para 2025.
"Embora as reduções propostas sejam substanciais, foram cuidadosamente calibradas para preservar o equilíbrio entre os três pilares da organização: paz e segurança, desenvolvimento sustentável e direitos humanos", assegurou Guterres, num momento em que a ONU atravessa uma grave crise de liquidez. Os cortes integram a "Iniciativa ONU80", um projeto anunciado pelo secretário-geral que visa mudanças estruturais na própria organização, como a fusão de unidades, eliminação de duplicações funcionais e estruturais, e cortes em funções que são desempenhadas noutras partes do sistema, incluindo nas Missões de Paz.
Isenta de cortes ficou a agência das Nações Unidas para os refugiados palestinianos (UNRWA), com Guterres a justificar que quaisquer reduções poderiam ter "consequências drásticas na espinha dorsal de toda a resposta humanitária a Gaza".
"A Conta de Desenvolvimento e a defesa do desenvolvimento de África também foram isentas de cortes que inevitavelmente teriam impacto direto no nosso apoio aos Estados-membros, dificultando os esforços para a Agenda 2030, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e a Agenda 2063 da União Africana", argumentou o ex-primeiro-ministro português.
Para as missões políticas especiais, o orçamento revisto ascende a 543,6 milhões de dólares (467,6 milhões de euros), uma redução de 96,3 milhões de dólares (82,8 milhões de euros) ou 15% em comparação com o orçamento inicialmente proposto para 2026, e uma redução de 21,6% face a este ano.
Segundo o líder da ONU, estes ajustes refletem os apelos para um secretariado da organização internacional "mais eficaz, ágil e resiliente" e contém propostas para "alinhar os recursos com as prioridades organizacionais, modernizar as operações internas e refletir uma resposta pragmática ao contexto fiscal em constante evolução".
Porém, reduções desta magnitude "terão inevitavelmente impactos programáticos e operacionais em todas as entidades e acarretarão ajustes na forma como o secretariado executa as atividades que lhe estão atribuídas", alertou o antigo primeiro-ministro português. "Estas medidas constituem reduções orçamentais substanciais que afetam as pessoas reais, as famílias e os futuros - e nunca devemos perder de vista esta dimensão humana", acrescentou.
As propostas incluem também a criação de centros administrativos em Nova Iorque e Banguecoque (Tailândia), a unificação do processamento de salários numa equipa global distribuída entre Nova Iorque, Entebbe (Uganda) e Nairobi (Quénia), e a transferência de funções desde as sedes mais caras - como Nova Iorque e Genebra - para locais de menor custo.
Desde 2017, o secretariado da ONU poupou 126 milhões de dólares (108,4 milhões de euros) com o fim de contratos de arrendamento comercial em Nova Iorque, especificou ainda Guterres. Além disso, a ONU planeia desocupar dois edifícios alugados em Nova Iorque até 2027, gerando poupanças de milhões de dólares anuais a partir de 2028.
As Nações Unidas foram severamente afetada por cortes de financiamento do seu maior doador, os Estados Unidos, após a tomada de posse de Donald Trump como presidente, em janeiro deste ano. Apesar da carga de trabalho da ONU aumentar de ano para ano, os recursos estão a diminuir em todos os setores, contribuindo para isso o facto de que nem todos os Estados-membros pagam na totalidade as obrigações anuais e muitos também não pagam a tempo.
Sobre o pagamento das obrigações anuais, Guterres criticou o "volume inaceitável de atrasos", frisando que a ONU terminou 2024 com um débito de 760 milhões de dólares (653,8 milhões de euros), dos quais 709 milhões de dólares (610 milhões de euros) ainda estão pendentes. Além disso, o secretário-geral assinalou que a ONU também não recebeu 877 milhões de dólares (754,2 milhões de euros) referentes às contribuições de 2025. Assim, o débito é atualmente superior a 1,3 mil milhões de euros.