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Lisboa, 23 Jul (Lusa) - O Congresso da UNITA, que terminou a 19 deste mês com a reeleição de Isaías Samakuva como líder, não afastou de vez o legado do antigo presidente, Jonas Savimbi, cuja imagem esteve omnipresente apesar de morto há meia década.
Confrontado com os ideais defendidos por Savimbi no Congresso de Muangai, localidade onde o movimento foi criado, em 1966, Samakuva, que praticamente nunca esteve na "mata", reutilizou os argumentos aí definidos para "combater" o seu adversário à liderança do agora partido.
O papel atribuído a Abel Chivukuvuku, que não é bem visto pelas bases da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) - o grosso dos militantes -, não resultou, sobretudo devido às críticas que fez, antes e durante o conclave, ao "savimbismo" ainda reinante.
O acto recorrente de lembrar Savimbi, cujas fotografias estavam bem à vista de todos na sala do congresso, torna difícil descolar a imagem de um movimento de guerrilha em partido político, tendo como pano de fundo as próximas presidenciais e legislativas, que não se sabe bem ainda se se realizam em 2008 ou 2009.
Tendo também em vista afastar o partido governamental desde a independência, em 1975, - Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) -, Samakuva optou por conquistar novamente a liderança do "Galo Negro" graças, nomeadamente, às críticas ao "savimbismo" protagonizadas pelo seu adversário.
Chivukuvuku, aliás, passou os últimos três anos a trabalhar naquilo que, segundo o que defende, deveria ser o projecto de futuro da UNITA: se o partido quiser ser uma alternativa, não pode continuar com a gestão do passado.
"Ironia do destino", lembrou recentemente o Semanário Angolense, que recordou que foi exactamente o que Chivukuvuku fez no passado, e não no que prometia para o futuro, que a maioria dos cerca de 1.100 delegados, sobretudo os das bases (maioritariamente de zonas rurais), encontraram razões para rejeitar a sua moção.
"Há militantes que não lhe perdoam. Primeiro, o distanciamento em relação a Jonas Savimbi, de quem disse, em mais de uma ocasião, que era uma carta fora do baralho, depois por não tolerarem o facto de muito recentemente se ter afastado de Isaías Samakuva", lê-se naquele semanário.
Mais grave foi o seu envolvimento no manifesto crítico do CRU, o Comité Renovador da UNITA, ao lado de Jorge Valentim e de Eugénio Manuvakola, de que viria a afastar-se horas antes do seu lançamento.
Também a memória do passado, lembrado por Samakuva durante o Congresso, esteve presente, pois foi recordado o facto de, em 1996, na qualidade de líder da bancada parlamentar do "Galo Negro", ter apelado à abstenção durante a votação do Orçamento Geral do Estado (em 1996), numa altura em que a guerra estava num dos seus períodos áureos.
A tudo isso, Samakuva respondeu com a sua faceta de "diplomata" - sempre "combateu" pela UNITA em várias capitais mundiais - para ganhar o apoio dos delegados, utilizando o "trunfo" Savimbi e as recordações do passado, mas caindo, inevitavelmente, num "dilema complexo", tal como defendeu João Melo, jornalista e escritor angolano.
"Se (a UNITA) abandonar o imaginário "savimbista", pode perder as suas bases rurais. Se não o abandonar, corre o risco de não se renovar e de não ser suficientemente atractiva para o resto da sociedade. Daí o lema integral do congresso: "Reafirmação da Identidade para a Mudança"", escreve João Melo.
"A rigor, porém, esse lema é uma contradição de termos: o país não poderá mudar conduzido por um partido assumidamente rural, exclusivista, fechado e culturalmente conservador", acrescentou, João Melo, numa alusão à necessidade de o partido "urbanizar" o seu eleitorado, tal como defendeu Chivukuvuku.
Pela frente, leia-se, as próximas eleições gerais, Samakuva terá de afinar estratégias para "afinar" a inversão do actual quadro de "exclusão social", em benefício das camadas mais vulneráveis da população, tal como vem referido no comunicado final do conclave.
No documento, foi reafirmada "a identidade da UNITA", renovadas "as energias", fortalecida "a democracia" e lançadas "as bases" para a vitória da UNITA "nas eleições da mudança".
A participação do deputado Chivukuvuku "ajudou a fortalecer a democracia interna e contribuiu para trabalhar e colocar em primeiro plano os interesses do povo", acrescenta-se no comunicado, em que Samakuva defende que o partido do "Galo Negro" é um "veículo nacional disponível" para os angolanos de todas as "origens e raças".
Para o líder da UNITA, "reafirmar a identidade da UNITA com base nos princípios de Muangai significa reafirmar que a UNITA existe e continuará a existir para acabar com a exclusão social em Angola".
Falta agora conhecer, está previsto para os próximos dias, a composição da nova Comissão Política da UNITA e segundo Clarisse Caputo, a porta-voz do encontro, Isaías Samakuva será o candidato deste partido às eleições presidências previstas para 2009.
JSD.
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