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Não vou referir-me a esse execrável programa de televisão. Esse é, sobretudo, uma ofensa à dignidade da mulher e do homem e, por isso, à dignidade humana. Tem público em estúdio e audiência televisiva. Há gente para tudo, como prova, à saciedade, o próprio programa. Este é uma manipulação pura. Uma real farsa a encenar e a jogar com os sentimentos das pessoas em estado degradado.
Vou referir-me ao teste de fidelidade e infidelidade por que vai brevemente passar a vida partidária e política portuguesa. Se tudo ocorrer, como está previsto, PS, PSD e CDS - para nenhum se rir dos outros - vão passar pela prova de ver o povo quem escolhe os candidatos por eles indicados ou os seus ex-correligionários a correr por conta própria. Fátima Felgueiras, Valentim Loureiro, Isaltino Morais e Avelino Ferreira Torres serão os actores em prova.
Não vale a pena descrever as diferentes razões que precipitaram a situação de cada um deles. Quase todas têm pontos em comum. Todos estão dados como arguidos em diferentes processos e por motivos algo idênticos, embora em matérias diversas. A opinião pública conhece bem os casos de cujas alegadas acusações impendem sobre estes candidatos. O que é interessante é perspectivar quanto irá significar, e já significa, para a democracia, esta condição de candidatos de "amor" pelo povo e de grande impacte popular, postergados pelos partidos.
Este será o espectáculo do caciquismo autárquico português no seu melhor.
Este será o "duelo" mais dilacerante entre a força dos "aparelhos partidários" e a dos "chefes das tribos". Das tribos que estarão sempre ao lado dos seus líderes, digam o que disserem deles, mesmo que eles representem os anti-valores do sistema social, moral e judicial vigente no reino. Este será o lado negro da história de que "o povo é quem mais ordena". Mesmo que o povo escolha contra a verdade da justiça, a dignidade da conduta, a lisura dos comportamentos. Contra o veredicto das instituições socialmente consagradas.
Na contracena deste cenário, a verdade nua e crua deste episódio, é que este é o povo que elege das outras vezes. Este é o povo que escolhe, habitualmente, os "carismáticos" indicados pela "ordem estabelecida" dos partidos. E, por isto, se esta prova é dura para os partidos, não é menos dura e cruel para a democracia que tem de reflectir por onde passam, agora, e das outras vezes, os labirintos das escolhas.
O presente episódio não põe em xeque apenas os "aparelhos partidários". Põe em xeque a própria democracia. Se o voto é a arma do povo, é difícil aceitar que ele seja igualmente arma mortífera contra a democracia. E esta é a reflexão mais profunda que estas eleições autárquicas podem trazer à consciência e à inteligência de uma sociedade dita democrática.
Não importam as razões e contra-razões pelas quais essas populações vão eleger esses "seus" candidatos. Importa que os vão eleger. É relativamente fácil explicar por que e pelo que os vão eleger. É melhor nem perder tempo com isso. Este não é apenas o lado trágico-cómico da questão. É o lado intragável e "mortal" de um sistema muito longe de ser puro, racional e razoável. Se os partidos estão em crise e a obediência aos seus "chefes" é coisa vã, pior é o estado de uma democracia que tem no seu bojo condições para episódios e actores deste género.
A questão de fundo é esta uma democracia em que Fátima Felgueiras, Valentim Loureiro, Isaltino Morais e Avelino Ferreira Torres "gozam" assim dela, é uma democracia carecida de ser refundada.
Paquete de Oliveira escreve no JN, semanalmente, aos sábados
A vitória da serenidade
Hoje em dia, o fenómeno político confunde convicção com histeria.
A liderança de José Ribeiro e Castro tem mostrado como se conseguem vitórias importantes, sem agredir verbal e visualmente o espectador/eleitor/cidadão (há muito quem confunda os três).
Se não, vejamos três objectivos todos conseguidos.
Primeiro, ficou claro que o desígnio estratégico de José Ribeiro e Castro era a autonomia do CDS (com uma política de aproximação ao PSD), hoje são mais de 50 as autarquias com entendimentos e, por outro lado, houve um reforço das listas próprias como, por exemplo, na capital onde se fez uma aposta na credibilidade e na qualidade de Maria José Nogueira Pinto.
Maria José Nogueira Pinto é, para José Ribeiro e Castro, muito mais que o resultado eleitoral do dia 5 de Outubro (que se espera positivo), é a aposta em alguém que acrescenta valor, qualidade, num objectivo que está traçado para 2009.
O CDS, em Lisboa, jogou bem, e ganhou mesmo antes de contar os votos.
Em segundo lugar, caiu por terra a crítica daqueles que, ou por querer o lugar vago, ou porque não conheceram nem a Internet nem o telefone, ou por simples má-fé, entendiam não poder um líder partidário ser eurodeputado.
A ignorância tem destas coisas. Nos últimos 25 anos, a única vez que o CDS subiu eleitoralmente numas eleições legislativas, tinha um líder eurodeputado, foi em Outubro de 1995.
Nunca noutra ocasião, tal sucedeu com Lucas Pires, desceu em 1983 e em 1985, Adriano Moreira, em 1987, Freitas do Amaral, em 1991, Paulo Portas, em 1999, 2002, 2005 (Freitas do Amaral, em 1991, embora o resultado fosse idêntico, passou de quatro para cinco mandatos).
Ora os factos são estes com uma maioria absoluta, não é o Parlamento o centro da vida política. Ainda bem que é o país e não o Parlamento.
A terceira vitória tem a ver com a tradição do presidente "One men show". Paulo Portas, culto, inteligente, brilhante, determinado por razões várias de conjuntura política e também pela sua própria personalidade foi o candidato do CDS às legislativas de 1999, às legislativas de 2002, às legislativas de 2005, mas também às eleições europeias, onde o CDS não concorreu coligado, e ainda às ultimas autárquicas Lisboa.
Enfim, sempre o presidente candidato.
Era um bom candidato, fazia excelentes campanhas, mas era muitas vezes acusado, com razão, de não poder desempenhar todos os mandatos.
Ora, José Ribeiro e Castro é apenas e só candidato a primeiro-ministro em 2009 (vice-primeiro-ministro, se houver coligação) e não tem de ser - nem deve - candidato a todos os actos eleitorais que encontra pelo caminho.
A credibilidade é dos credíveis.
O caminho é o mais difícil, mas é seguramente o único que pode levar o CDS a fazer a diferença à Direita.
Políticas inovadoras, e uma linha de rumo sem cedências a tácticas do momento ou aberturas de telejornal.
Para José Ribeiro e Castro, este não é um caminho, é o caminho.
