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Profissionalismo, inteligência, sentido de humor, obcecado em vencer e crente em Deus. Bem podiam ser os predicados de Pinto da Costa, mas são as cinco premissas incontornáveis de Antero José Gomes da Ressurreição Henrique, director-geral do futebol do F. C. Porto. O delfim do presidente faz hoje 40 anos e é um dos elementos com mais peso e preponderância na estrutura do clube. Há mesmo quem o aponte como um dos possíveis sucessores do grande líder.
A face reservada do homem mais próximo do presidente pode ser interpretada como uma estratégia de defesa, mas quem o conhece caracteriza-a como um comportamento inato e típico dos tempos de criança. Enquanto os amigos se identificavam com os grandes craques de futebol, os que marcavam mais golos ou os que faziam as fintas mais exuberantes, Antero Henrique revia-se nos jogadores que passavam despercebidos. Preferia os mais regulares, os mais discretos e os mais eficientes.
Hoje cabe-lhe a responsabilidade de formar e gerir o plantel do F. C. Porto, com inegável sucesso, ele que em três anos de director-geral festejou outros tantos títulos nacionais.
Fixava números
Filho de uma professora primária e de um sargento da Guarda Fiscal, nasceu em Vinhais, vila transmontana do distrito de Bragança, a 7 de Abril de 1968, quando Pinto da Costa ainda subia a escada do dirigismo portista. Teve uma educação católica - um dos tios é padre - e assente em princípios sólidos e bem disciplinados. Era um aluno aplicado e que também "gostava de jogar pingue-pongue" na escola preparatória, como recorda Mário Gonçalves, o actual presidente do F. C. Vinhais. Nessa altura, nas brincadeiras e nos jogos de miúdos, já revelava uma faceta marcante da sua personalidade "Se não ganhasse, ficava amuado", sublinha o amigo Roberto Patrick Afonso, comerciante de pneus.
Mas Antero Henrique também se distinguia pela face iluminada, pelo sentido de observação e pela perspicácia - hoje é uma das suas imagens de marca. Era capaz de fixar os pormenores mais insignificantes, aqueles que passavam ao lado dos amigos mais chegados, mas que faziam a diferença nos momentos oportunos "Tinha uma memória e uma capacidade impressionante de fixar números. Sabia de cor vários números de telefone e as datas de nascimento. Olhava e fixava logo. É muito inteligente", resume Nuno Afonso, proprietário do restaurante "Madre Garcia", com quem viveu na mesma casa quando estudaram no Porto.
Em miúdo, Roberto Patrick Afonso diz que Antero Henrique "nutria simpatia pelo Benfica", mas os amigos que o acompanharam na adolescência garantem que "sempre foi portista", vibrava muito com as vitórias dos dragões e gostava de ir às Antas ver os jogos e os treinos. Um dos episódios mais marcantes foram os festejos da magnífica vitória em Viena, na Taça dos Campeões Europeus, quando Madjer e Juary colocaram o nome do F. C. Porto na rota internacional. "Tem um sentido de humor único, tem o sangue quente e é emotivo. E nunca se esqueceu dos amigos da terra", conta Edmundo Afonso.
Snooker depois do jantar
A vida académica repartiu-se entre Vinhais, Bragança e o Porto, onde chegou no ano lectivo de 1986/87, para se instalar numa casa na Rua de Santa Catarina, bem perto da Praça Marquês do Pombal, onde todas as noites desafiava a destreza nas mesas de snooker. Ir ao cinema era outro dos passatempos preferidos e o grande defeito era a dificuldade em cumprir horários, pois "chegava sempre atrasado" aos convívios. "Era uma pessoa discreta e muito religiosa. Ia todos os domingos à missa", diz Abílio Barreira, desenhador na Câmara Municipal de Vinhais, que viveu na mesma casa nos tempos de escola.
Em 1990, abre-se um novo capítulo que iria mudar a sua vida. Antero Henrique entrou no F. C. Porto como tarefeiro a colaborar numa renovação do número de associados. Depois, fixou-se na revista Dragões, primeiro como secretário de redacção e, depois, como coordenador. A partir daí, começa a subir nas escadas do clube, revelando uma capacidade de trabalho, eficiência e perspicácia acima da média.
Leal ao presidente
Foi assessor de imprensa, director de relações externas, responsável pelo departamento de marketing, desempenhando, ainda, funções ao nível da organização dos jogos. Foi ele que começou a preparar as conferências de imprensa com os treinadores - no F. C. Porto, nunca mais ninguém enfrentou os jornalistas desprevenido. Nessa altura, no início desta década, as suas opiniões no que ao futebol diz respeito já eram ouvidas e muitas vezes decisivas. Quando rebentou o Apito Dourado, esteve sempre ao lado de Pinto da Costa, por quem tem uma lealdade acima de qualquer suspeita. Em 2005, foi nomeado director geral do futebol e, a partir daí, o F. C. Porto já vai em três títulos nacionais, uma Taça de Portugal e uma Supertaça. Quem já trabalhou com ele, diz que Antero Henrique antecipa as decisões de uma forma prática "Enquanto os outros ainda estão a pensar, ele já está a executar". Com ele, o futuro começa a ser construído de imediato. Talvez por isso não falte quem o aponte como sucessor de Pinto da Costa.
