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Cidade do Vaticano, 10 Jul (Lusa) - A Igreja Católica "não renuncia à sua convicção de ser a única verdadeira" Igreja de Cristo, embora reconheça que nas igrejas ortodoxas e nas "comunidades cristãs" surgidas da Reforma - que não considera igrejas - haja elementos de salvação.
Assim se afirma no documento "Respostas a algumas perguntas acerca de certos aspectos da doutrina sobre a Igreja", preparado pela Congregação para a Doutrina da Fé, (ex-Santo Ofício), apresentado hoje pelo Vaticano.
As reacções não se fizeram esperar: O Conselho Ecuménico das Igrejas (COE), que reúne 347 igrejas protestantes, ortodoxas, anglicanas e outras, representando 560 milhões de cristãos em mais de 110 países, criticou de imediato a posição do Vaticano.
Também a Federação das Igrejas Evangélicas em Itália e a Igreja Valdese criticaram o documento hoje divulgado pelo Vaticano, classificando-o de um "passo atrás" e considerando os protestantes como de terceira classe.
O envolvimento ecuménico "não significa que a Igreja católica renuncie à convicção de ser a única verdadeira Igreja de Cristo", diz o texto, assinado pelo prefeito da Congregação, o cardeal William Levada, e "aprovado e confirmado" pelo Papa. Em anexo, explica-se que o objectivo é "precisar" o significado "autêntico" de algumas expressões eclesiásticas que correm o perigo de ser tergiversadas nas discussões teológicas.
O texto apresentado hoje refere-se às diferentes interpretações geradas pelo documento do Concílio Vaticano II "Lumen Gentium", de 1963, em que se afirma que a Igreja de Cristo subsiste na Católica, e no polémico "Dominus Iesus" do ano 2000.
O documento está dividido em cinco perguntas-respostas e um comentário.
A primeira, sobre se o Concílio Vaticano II mudou a anterior doutrina da Igreja, tem como resposta não. "Não quis mudar nem de facto mudou", embora a tenha desenvolvido, aprofundado e exposto publicamente.
No comentário precisa-se que a "Lumen Gentium" não mudou a doutrina tradicional da Igreja e que "Dominus Iesus" "só retomou os textos conciliares".
A segunda questiona "como se deve entender a afirmação de que a Igreja de Cristo subsiste na Católica". A resposta é que Cristo na terra "só constituiu uma Igreja" e que essa, "constituída e ordenada como uma sociedade subsiste" na Igreja Católica, governada pelo sucessor de Pedro (o Papa) e os bispos em comunhão com ele.
O texto acrescenta que, embora se possa afirmar que a Igreja de Cristo está presente nas outras Igrejas e nas comunidades eclesiásticas separadas "graças a elementos de santificação e verdade existentes", o termo "subsiste" só se pode aplicar à Igreja Católica.
Segundo o documento, caso se admitam "muitas subsistências" da Igreja fundada por Cristo a "unicidade" dessa Igreja seria prejudicada.
E neste ponto o Vaticano refere-se ao teólogo brasileiro Leonardo Boff, segundo o qual - precisa o texto - a única Igreja de Cristo poderia subsistir noutras igrejas cristãs".
"Pelo contrário, o Concílio escolheu a palavra ´subsistit´ para esclarecer que existe uma só subsistência da verdadeira Igreja, enquanto que fora da sua estrutura visível existem só elementos eclesiáticos, os quais, sendo elementos da mesma Igreja, tendem e conduzem à Igreja Católica".
Por que é que se usa "subsiste" e não simplesmente o verbo "é", é a terceira pergunta. O Vaticano considera que não muda nada e que se usa para expressar mais claramente que fora da Igreja se encontram muitos elementos que induzem à unidade.
Também se reconhece que a identificação da Igreja de Cristo com a Católica "não se pode entender como se de fora da Católica houvesse um vazio eclesiástico".
"A substituição de ´est´ por ´subsistit´, contra tantas interpretações infundadas, não significa que a Igreja Católica renuncie à sua convicção de ser a única verdadeira Igreja de Cristo. Indica uma maior abertura ao ecumenismo", precisa o texto.
A quarta pergunta refere-se à razão por que o Concílio Vaticano II atribui o nome de "Igrejas" às Orientais separadas de Roma. Segundo a resposta, embora separadas têm "verdadeiros sacramentos e sobretudo, em virtude da Sucessão apostólica, o sacerdócio e a eucaristia".
O documento precisa que por não reconhecerem o primado de Pedro (do Papa), sofrem de "carências", mas acrescenta que o Primado não deve entender-se como algo estranho ou em rivalidade" com os bispos dessas igrejas, devendo antes ver-se como serviço à unidade.
O documento reconhece que estas igrejas também são "meios de salvação".
O quinto e último ponto: por que é que a Igreja Católica não reconhece como igrejas as surgidas da reforma protestante do século XVI e as chamadas "comunidades cristãs". O texto sublinha ser assim porque não tem a sucessão apostólica mediante o sacramento da Ordem, um elemento constitutivo essencial da Igreja".
Além do sacerdócio, não conservaram a Eucaristia de maneira "integra", o que impede - diz o documento - serem consideradas igrejas.
Não obstante, também lhe reconhece elementos de santificação e verdade, "que têm um valor salvador".
O documento recorda que o diálogo ecuménico é uma das prioridades da Igreja Católica e de Bento XVI e precisa que para que seja realmente construtivo "é necessária a fidelidade à identidade da fé católica".
TM.
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