Ilustradora assinala dez anos de carreira com o novo livro "Meninos das Lágrimas" e uma exposição no Porto.
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Gosta de captar aquilo que não aparece com frequência nos perfis das redes sociais: "A tristeza, o erro, o azar, o feio, o malfeito." O outro lado da "vida ideal que se projeta." Mariana, a Miserável, ilustradora de 34 anos nascida em Leiria, assinalou dez anos de carreira com o lançamento de "Meninos das lágrimas", livro que tematiza o choro a partir dos célebres quadros de Giovanni Bragolin que se espalharam pelas casas portuguesas e europeias nos anos 1970 e 1980 .
Se a tristeza sempre fez parte do seu trabalho, povoado por figuras de traço inconfundível, com rostos largos e proeminentes, deliberadamente imperfeitos, neste projeto, iniciado há três anos, quis explorar o tema com "mais afinco." "Interessou-me lidar com essa naturalidade com que os "meninos das lágrimas" se expunham nas casas das nossas tias e avós. Porque a tristeza é habitualmente algo que se esconde, que denuncia uma fraqueza. Mas, para mim, é o que nos torna vivos, humanos", disse a ilustradora ao JN.
"Miséria e rock"n"roll"
Apesar do seu nome artístico apontar para um território de lágrimas (na biografia que criou para a Miserável pode ler-se que na infância sonhava em ser florista, mas depressa caiu numa vida de "miséria, fossa e rock"n"roll", acabando por vender o coração numa loja de souvenirs para pagar as contas), Mariana Santos, que trabalha atualmente entre Lisboa e Porto, diz que "não é intencional" essa tendência para os temas tristes, simplesmente "as coisas encaminharam-se nesse sentido": "Acho a tristeza inspiradora, e sempre tive facilidade de falar sobre vulnerabilidades. Gosto do que é verdadeiro, e as lágrimas geralmente não enganam. Mas também não tento impor a minha visão, apenas abrir um tópico de conversa."
Percurso versátil
Falando sobre o lugar da ilustração, Mariana diz que deverá ser entendida como uma disciplina aberta, capaz de dialogar com outras artes, e o seu percurso tem provado essa versatilidade: além de trabalhos para marcas ("com que me identifique minimamente"), criou imagens para murais e espetáculos, cartazes e booklets de CD, além de ter participado em inúmeras exposições individuais e coletivas.
Confessa um desejo antigo: fazer ilustrações para jornais partindo da atualidade. "É algo que parece estar a perder-se", haver ilustradores, como o André Carrilho ou o Nuno Saraiva, que apresentam "um ponto de vista particular sobre as notícias e enriqueciam esteticamente a publicação. Parece-me um desafio fascinante esse compromisso de fazer a leitura da atualidade através da ilustração."
"Meninos das lágrimas", o seu primeiro livro, encontra-se disponível para compra na Editora Número e os desenhos originais estão expostos na Ó! Galeria, na Rua Miguel Bombarda, no Porto, até 14 de outubro. v