Os argumentos usados na praça pública para justificar os atrasos na colocação dos professores são tão diversos e contraditórios que refletem as poucas mudanças estruturais de um sector suspostamente esclarecido. Desde logo, a culpa destes concursos falhados como consequência da existência de escolas com "contratos de autonomia". Ou seja, a incapacidade da máquina do Ministério em lidar com colocação de professores nestas escolas ficava resolvido se fosse eliminado qualquer embrião de descentralização. "Sir Humphrey" (Yes Minister) não diria melhor.
Joaquim Azevedo, que já foi secretário de Estado, explica: "É preciso fazer evoluir o sistema, combinando a seriação nacional e a colocação de um quadro base nas escolas, com uma parte do recrutamento feito pela escola, pura e simplesmente, sem mais fórmulas mágicas do MEC." Difícil? Para o Ministério tudo é dificílimo. Exigência é só para professores e alunos.
E se entretanto o sistema pudesse ser profundamente revisto para que exames/concursos/início das aulas fossem feitos mais cedo? Impossível, dirá Sir Humphrey. Já agora, se se conseguisse dar uma carreira digna e estável a alguns destes milhares de professores, eternamente precários, então sim, daríamos um salto de dimensão intergalática.
[perguntas]
[1] Os problemas sistemáticos na colocação de professores nas escolas com "contrato de autonomia" revelam o erro desta excepção ou provam a falta de uma efectiva descentralização do Ministério da Educação?
[2] É possível fazer a colocação de professores até ao final de Julho? Se sim, porque nunca foi feito?
[respostas]
Albino Almeida, conselheiro nacional de educação
[1] Os erros no modelo de colocação de professores resulta de uma opção do governo por um modelo errado e incompetente, sem avaliação e escuta activa de todos os parceiros envolvidos e nada tem que ver com a Autonomia!
[2] Tem de ser possível, porque é indispensável. Nunca se fez bem porque não houve um trabalho preparatório sério! Estas políticas têm estado mais ligadas à agenda das finanças públicas, do que à Educação!
Braga da Cruz, presidente da Fundação de Serralves
[1] Não acredito que haja problemas desta natureza em países onde a descentralização política e administrativa vigora. A democracia reclama que se aplique o princípio da subsidiariedade. Se um problema pode ser resolvido no nível sub-nacional, porque tem de ser gerido de forma centralizada?
[2] Tem de ser possível, nem que se mude o que tiver de ser mudado. Porque se insiste num modelo que todos os anos gera instabilidade nas escolas? Só por falta de ousadia, imaginação e competência.
Joaquim Azevedo, docente da Escola das Artes da Católica Porto
[1] O Ministério nunca se descentralizou e esse é o problema. Hoje, recentraliza-se. É preciso fazer evoluir o sistema, combinando a seriação nacional e a colocação de um quadro base nas escolas, com uma parte do recrutamento feito pela escola, pura e simplesmente, sem mais fórmulas mágicas do MEC. Este ano ainda não acabou a confusão e...para o ano, como vai ser?
[2] Claro que é possível, desde que o modelo seja alterado.
Maria Arminda Bragança, secretária coordenadora da CPLP-Sindical da Educação
[1] Se o Ministério da Educação já tivesse acabado com a contratação sucessiva de professores, teria evitado toda esta confusão. Não são as escolas com "contratos de autonomia" a causa da situação caótica da colocação de professores, mas sim a política seguida pelo Ministério ao recorrer a professores contratados para suprir o que é permanente.
[2] Não é possível devido a certos constrangimentos, nomeadamente aos exames nacionais, ao período em que decorrem as matrículas, entre outros.
Marques dos Santos, professor universitário
[1] É essencial descentralizar o Ministério da Educação. Tal como está é ingovernável, até pelos interesses instalados no ME. Descentralize-se, reduza-se a burocracia e criem-se condições adequadas à gestão local dos agrupamentos de escolas. Monitorizem-se os resultados e atue-se em conformidade com os mesmos.
[2] O processo de colocação de professores não funciona. É demasiado complexo e centralizado. A descentralização do ME será um passo significativo para resolver este problema.
Rui Reis, investigador e professor catedrático da Universidade do Minho
[1] Não se podem indexar os problemas sistemáticos na colocação de Professores para o tipo de escola e colocar a tónica nas Instituições com autonomia funcionarem pior. Existem muitas Escolas com autonomia que nunca têm estes problemas. Mas essas não são acessíveis para a maioria da população! Como sempre em Portugal a excessiva centralização cria problemas como se viu ao longo deste inenarrável processo!
[2] Acho que sim. Porque não? Será por ninguém ter tido a coragem de tentar?
Rui Teixeira, presidente do Instituto Politécnico de Viana
[1] Às vezes parece que há convicção política para promover a autonomia/responsabilidade das escolas, do básico ao superior. Mas isto morre, sempre, às mãos da turba que invade o(s) ministério(s) em cada ciclo político. Essa turba de "boys" alimenta-se de "poderezitos" que esmagam as instituições com "experimentalismos" baratos e "improvisos" - incompetência. Não têm mais!
[2] Claro que é! Haja vontade e descentralização efetiva! As competências estão nos professores e não nos boys.
Sebastião Feyo, reitor da Universidade do Porto
[1] Os problemas não estarão nas Escolas com contrato de autonomia. Residem principalmente na nossa dificuldade organizacional colectiva, mesmo cultural, de programar e preparar atempadamente acções.
[2] Tem que ser, mas temos dificuldades já comentadas. Veja-se o caso análogo do acesso ao ensino superior que deveria ter a segunda fase concluída em tempo de todos os estudantes começarem as actividades na mesma data.
