O êxito do projeto "Magalhães" nas escolas esteve sempre minado por uma lacuna base: a formação dos professores. Quando agora o estudo da Universidade Portucalense vem dizer que o resultado educacional desta experiência é sofrível, podemos acreditar certamente nalgumas premissas. Mas talvez faltem outras.
As telecomunicações são um sucesso em Portugal. Podemos sempre dizer que os adolescentes e estudantes universitários não conseguem direcionar esta extraordinária ferramenta num rumo produtivo. Mas as virtudes desta operação só estarão ou não à vista daqui a uns anos. Entretanto, há uma coisa que sabemos já: a capacidade dos portugueses para usarem a ferramenta da Internet para comprarem viagens de avião, alojamentos no estrangeiro e pesquisarem oportunidades profissionais já ditou o "sucesso" desta fuga para o estrangeiro de uma legião de jovens desempregados.
Há que juntar a isto um outro dado. A PT era uma marca essencial na inovação portuguesa e um grande recrutador de engenheiros. A sua compra por um grupo estrangeiro, sobretudo se olhado em economias de escala no âmbito de um grupo internacional, coloca em causa a vanguarda nacional nesta área tão estratégica? Parece que sim. O que é gravíssimo. Como o será, também, a perda de vocação de mecenato para muitos projetos da Cultura portuguesa. Tudo isto mexe com o futuro da "massa cinzenta" do país e é mais do que simples "mercado". Para o Governo, no entanto, parece não passar disso.
[perguntas]
[1] A perda de controlo nacional da PT pode prejudicar os setores educativos e culturais portugueses?
[2]. Um recente estudo indica que a iniciativa de fornecimento de computadores "Magalhães" às escolas não atingiu os objetivos educacionais propostos. Concorda?
[respostas]
Albino Almeida, conselheiro nacional de Educação
[1] Essa perda é um risco fortíssimo, por opção política errada do governo, em prejuízo da componente tecnológica da estratégia nacional, para os tempos actuais de competição global!
[2] Sim. Os computadores deveriam ter sido entregues às escolas, integrar os seus recursos técnicos e pedagógicos, em simultâneo com uma lei de certificação de conteúdos digitais por referência ao currículo, que as escolas escolheriam como escolhem os manuais!
Braga da cruz, presidente da Fundação de Serralves
[1] A PT foi das empresas mais inovadoras, gerando desenvolvimento tecnológico num dos domínios mais estratégicos para a Economia Nacional. A perda do controlo nacional põe em causa o ambiente de inovação criado e as indústrias criativas e culturais também sofrerão com isso.
[2] Não sei se o estudo referido faz o balanço entre os custos e os benefícios associados à generalização das tecnologias de informação. Apenas reconheço a importância decisiva das TICs na aprendizagem.
Joaquim Azevedo, docente da Escola das Artes da Católica Porto
[1] Pode, tudo dependerá da estratégia empresarial que vier a ser definida para a PT.
[2] A iniciativa Magalhães tinha vários objetivos, sendo um deles educacional. E este decompõe-se em muitas dimensões: tecnológica, escolar (ex. linguística), atitudinal (ex autonomia), social (ex. envolvimento da família), etc. O que terá sido alcançado em termos escolares terá sido inscrito nessa pequena parcela. Em educação escolar, é preciso fugir das iniciativas episódicas.
Maria Arminda Bragança, secretária coordenadora da CPLP-Sindical da Educação
[1] Julgo que poderá haver algum impacto negativo na manutenção do investimento feito ao longo dos anos pela PT em projectos educativos, culturais e sociais.
[2] Houve aspectos positivos que foram descontinuados pela incapacidade completa do Governo de então, em acompanhar devidamente o investimento feito na aquisição dos computadores. Refiro, por exemplo, a formação dos professores necessária para a sua utilização adequada em contexto de sala de aula.
Marques dos Santos, professor universitário
[1] Mais do que saber se o controlo da PT é nacional ou estrangeiro interessa perceber quanto os novos controladores da empresa valorizam a responsabilidade social e se estão empenhados em manter o espírito de inovação que tem caracterizado a PT.
[2] O programa não teve duração suficiente para se poder avaliar com rigor os seus efeitos na educação dos alunos do ensino básico. Considero, contudo, que assegurar a literacia digital de todas as crianças é essencial para Portugal.
Rui Reis, investigador e professor catedrático da Universidade do Minho
[1] É importante ter uma PT forte e com centralidade da sua atividade em Portugal. Mas não me parece que haja uma ligação direta entre o controlo nacional e a influência de uma empresa em determinados sectores.
[2] O "Magalhães" era uma boa iniciativa, que parece não ter atingido os objectivos inicialmente ambicionados. Mas não foi um falhanço! Os programas e os professores estão muitas vezes desajustados e impreparados para usar meios como o "Magalhães" no ensino diário.
Rui Teixeira, presidente do Instituto do Instituto Politécnico de Viana
[1] Portugal tem de acreditar que "é possível" - e que é possível cá - com os "nossos"! Sabemos que os caminhos são escassos, estreitos e duros. A PT ensinou-nos que quando uma empresa busca inteligência os resultados aparecem ao mais alto nível. Claro que não ficamos dispensados da necessidade de administrações sérias. Na PT perdemos todos.
[2] É possível! Primeiro é preciso "a paz, o pão, a saúde e a educação" e, só depois, os computadores podem ajudar... se os soubermos usar!
Sebastião Feyo, reitor da Universidade do Porto
[1] Há principalmente o risco de prejudicar a actividade de investigação A deslocalização dos centros de decisão pode levar á diminuição de capacidade de decisão local e à deslocalização da investigação e dos recursos. Os nossos centros terão que se impor pela mais-valia da sua actividade.
[2] Não sei se atingiu os objetivos, mas independentemente do modelo de negócio, a ideia do Magalhães foi obviamente boa.
