Chegou o tempo dos festivais de música, "Serralves em Festa" bateu o recorde de visitas (140 724), etc.. Mas, o que é a Cultura? Velha questão. Há quem não aceite esta popularização como um fenómeno de "Cultura".
A maioria dos grandes festivais de música são um sucesso. Mas, infelizmente, isso não esconde uma outra Cultura com menor participação do público, mais inovadora, difícil, ou simplesmente mais clássica - como o teatro, a música erudita, as artes plásticas. Maria Arminda Bragança lembra um estudo publicado na União Europeia que dá conta não só da diminuição do número de portugueses que participa nesta "Cultura" como da tendência geral europeia para que a Cultura "difícil" tenha menos espectadores. Daí a questão: as crises que vivemos na Europa são consequência de uma epidémica falta de reflexão?
[perguntas]
[1] Festivais de música e Serralves em Festa são manifestações de massa que representam que tipo de cultura?
[2] Qual a principal perda cultural gerada pela crise dos últimos anos?
[1] Os festivais de música representam uma cultura para massas, essencialmente jovens! Serralves em Festa é um evento com uma oferta cultural, musical, recreativa e lúdica muito diversificada.
[2] Sem dúvida a perda cultural maior tem a ver o teatro, situação que atinge também, não só a oferta nacional promovida pelas companhias nacionais, mas também os grupos de teatro amador. Outros eventos culturais específicos que registam perdas são os concertos de música clássica!
Joaquim Azevedo, docente da Escola das Artes da Católica Porto
[1] Um cultura mais de fruição e consumo do que de produção e participação ativa, sociocomunitária, embora com importante papel de apoio a produções já existentes, com relevante papel sociocultural.
[2] A capacidade crítica, porque nos fez regressar o nosso principal Adamastor meio adormecido: o medo. O medo de "inscrição" dos nossos desejos e esperanças no espaço público.
Maria Arminda Bragança, vice-presidente da Federação Nacional de Educação
[1] Considerando que Portugal é um dos países da UE com menor participação em actividades culturais, Serralves em Festa é um polo de atração e sensibilização da população em geral.
[2] A principal perda cultural, no caso dos portugueses, tem sido o cinema e a participação em festivais de música, segundo um estudo feito pela UE em 2013. Este estudo mostra que os europeus se interessam cada vez menos pela
participação em actividades culturais.
Braga da Cruz, Presidente da Fundação de Serralves
[1] A fronteira entre a cultura e o entretenimento nem sempre é fácil. Serralves em Festa é uma forma de atrair à Cultura Contemporânea aqueles que dela andam arredados, em ambiente descontraído, mas com uma oferta cultural muito diversificada e sempre de qualidade.
[2] O mais negativo é aceitar que em tempos de crise, a cultura e os bens do espírito são acessório e dispensáveis. Está demonstrado que a cultura, para além de contribuir para o equilíbrio de cada um, também tem retorno económico no PIB, no emprego e até no crescimento da matéria fiscal. Não esquecer que a Cultura Contemporânea valoriza o talento criativo, elemento crítico para a promoção da inovação na sociedade e na economia.
Marques dos Santos, reitor da Universidade do Porto
[1] A cultura integra componentes diversas. Cada pessoa constrói ao longo da vida as suas componentes enriquecendo-as com vários graus de desenvolvimento e profundidade. Estas duas manifestações de massa são contributos para algumas dessas componentes.
[2] O enriquecimento de várias das componentes da cultura do cidadão exige recursos, tanto do próprio como da sociedade para colocar à sua disposição instrumentos para tal. A crise veio limitar muito esses recursos!
Rui Reis, investigador e professor catedrático da Universidade do Minho
[1] Não distingo a cultura em manifestações de massa ou de elites. Há festivais de música de grande qualidade e o Serralves em Festa é um excelente exemplo de como se pode envolver as pessoas em atividades culturais.
[2] Houve muitas atividades que dependiam de financiamentos públicos que deixaram de ser realizadas. Isso notou-se quer a nível local, quer a nível nacional. A disponibilidade de muitos privados para ajudar a financiar atividades culturais foi também bastante reduzida.
Rui Teixeira, presidente do Instituto Politécnico de Viana
[1] A cultura é um todo-mosaico que se estende do conhecimento, à moral, às ideias, aos costumes, aos comportamentos, aos símbolos, às crenças, às artes, etc., que o homem absorve pela sociabilização, com a qual se identifica e na qual encontra o sentido maior da sua existência. O que acima se refere são diferentes matizes desse todo diverso e exemplos de magnitude e excelência, como Serralves.
[2] O acesso à própria cultura, promovida, as mais das vezes, a luxo.
