
Face ao aumento da esperança de vida e à maior prevalência de doenças oculares, torna-se essencial valorizar a saúde ocular. Dos mais pequenos aos mais idosos, consultas regulares com o Médico Oftalmologista são o melhor investimento para manter uma visão saudável.
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Logo após o nascimento, a luz transmite estímulos até à retina, ultrapassando as estruturas transparentes do globo ocular e possibilitando que os fotões excitem células especiais do fundo do olho, que convertem esse sinal luminoso em sinal elétrico. Por sua vez, o nervo ótico e outras estruturas conduzem esta informação até à região posterior do córtex cerebral, responsável pela sua interpretação. Este complexo sistema permite-nos reconhecer e compreender o que nos rodeia - algo que parece simples, mas resulta de um processo biológico extremamente sofisticado.
O desenvolvimento da visão, o estrabismo e a ambliopia
Nas crianças há uma oportunidade única de estimular o cérebro - não apenas para ver naquele momento, mas também para aprender a ver. Nos bebés e crianças mais pequenas existe uma progressão visual impressionante, estimulada pelas imagens e pela luz que as rodeia. Sem condições visuais ideais, o cérebro não desenvolve todo o seu potencial visual. Por isso, é essencial rastrear precocemente erros refrativos elevados, diferenças acentuadas entre os dois olhos ou estrabismo, que podem comprometer esse desenvolvimento (dando origem ao "olho preguiçoso" ou ambliopia).
A catarata
Com o avançar da idade, podem surgir doenças degenerativas como a catarata, resultante da perda de transparência do cristalino - uma condição muito comum, estimando-se que cerca de metade das pessoas aos 70 anos tenha catarata ou já tenha sido operada. É a opacificação da lente interna do globo ocular que dá origem à catarata, que se instala de forma lenta e progressiva, reduzindo gradualmente a nitidez das imagens e a qualidade de vida. A idade é claramente o principal fator de risco, mas também existem outras causas, como traumatismos, inflamações oculares ou doenças sistémicas, nomeadamente a diabetes. Em casos raros, podem ocorrer cataratas congénitas, que exigem cirurgia logo nas primeiras semanas de vida.
O tratamento da catarata é exclusivamente cirúrgico, sendo atualmente uma das intervenções mais seguras e com maior taxa de sucesso em toda a Medicina. Durante o procedimento, a lente natural opacificada é removida e substituída por uma nova lente intraocular, que devolve a transparência ao olho e restaura a visão.
Nos casos de miopia ou hipermetropia elevadas, a cirurgia pode ainda reduzir a graduação, diminuindo a dependência de óculos após o procedimento.
Evoluções do LASER e do OCT e outras doenças
A Oftalmologia tem evoluído de forma extraordinária, com novos fármacos, e fantásticos avanços no LASER e tecnologias de imagem, como a tomografia de coerência ótica (OCT), que permite observar estruturas microscópicas da retina com altíssima definição.
Veja-se o caso do LASER nas rasgaduras de retina: na maior parte dos casos possibilita evitar um grave descolamento de retina que requer uma intervenção cirúrgica intra-ocular complexa. Mas para tal sucesso é imperioso que os doentes saibam que "faíscas" ou "moscas" recentes são sinais de alarme, que exigem observação pelo médico Oftalmologista tão breve quanto possível. O adiar da observação de doentes com aqueles sintomas faz toda a diferença no risco de cegueira.
Atualmente podemos eliminar com LASER 4 ou 5 dioptrias de miopia à maioria dos nossos doentes que desejam não usar óculos, depois de serem adultos e terem amadurecido o seu sistema visual. A cirurgia dá uma grande alegria à generalidade dos pacientes. Contudo se o cérebro tem "preguiça" na interpretação essa intervenção não vai permitir resolver tudo, já que é nos primeiros anos de vida que se decide se aproveitamos todas as capacidades potenciais de visão.
Simultaneamente temos doenças onde as atitudes individuais de prevenção são eficazes. Por exemplo, nos tumores das pálpebras o evitar de exposição solar exagerada e desprotegida implica redução da sua incidência. No queratocone e mesmo tendo outros tratamentos, o evitar da pressão sobre os olhos é fundamental para não ocorrer progressão, sublinhando o valor de ditados antigos, como "esfregar os olhos só com os cotovelos".
Retinopatia diabética
A incidência da diabetes em Portugal é hoje muito elevada, afetando mais de um milhão de pessoas, o que coloca em risco a visão de mais de cem mil portugueses. Uma das principais complicações oculares desta doença é a retinopatia diabética, resultado do dano progressivo nos vasos sanguíneos da retina causado pela hiperglicemia prolongada. Nas fases iniciais, a doença pode ser silenciosa, sem sintomas visíveis, mas à medida que evolui pode provocar hemorragias, edema macular e formação de novos vasos anómalos, conduzindo à perda visual significativa e, em casos avançados, cegueira irreversível.
A prevenção e o diagnóstico precoce são fundamentais. O controlo dos níveis de glicemia, da tensão arterial e dos lípidos sanguíneos reduz substancialmente o risco de progressão. Paralelamente, o exame oftalmológico regular através de exame do fundo ocular ou retinografia é essencial. Quando detetada a tempo, a retinopatia diabética pode ser tratada eficazmente com LASER, injeções intravítreas de fármacos anti-VEGF ou, em situações avançadas, cirurgia vítreo-retiniana, permitindo preservar a visão e a qualidade de vida dos doentes.
Glaucoma
O glaucoma é conhecido como o "ladrão silencioso da visão", pois evolui sem sintomas evidentes até fases avançadas. Está geralmente associado ao aumento da pressão intraocular, que provoca lesão progressiva do nervo ótico e perda de campo visual irreversível.
O diagnóstico precoce é essencial - mede-se a pressão ocular e examina-se o nervo ótico regularmente e complementa-se o estudo com exames complementares.
Embora não tenha cura, na maioria dos casos o glaucoma pode ser controlado com colírios, tratamentos a LASER ou cirurgia, evitando a progressão numa luta contínua para preservar a visão funcional.
DMI
A Degenerescência Macular da Idade (DMI) é outra das principais causas de perda visual nas populações mais séniores. Afeta a mácula, a região central e mais nobre da retina; a área responsável pela visão detalhada. Manifesta-se por distorção das linhas, dificuldade em ler ou reconhecer os rostos.
Atualmente tem formas tratáveis com injeções intravítreas de medicamentos inovadores. A prevenção baseia-se na alimentação, proteção solar ocular e vigilância periódica a partir dos 55 anos.
Face ao aumento da esperança de vida e à maior prevalência de doenças oculares, torna-se essencial valorizar a saúde ocular.
Dos mais pequenos aos mais idosos, consultas regulares com o Médico Oftalmologista são o melhor investimento para manter uma visão saudável.
Cuide da sua visão - vai precisar dela todos os dias da sua vida.
Pedro Menéres
Médico Oftalmologista
Presidente da Direção da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia (SPO)