
Oeiras 16/12/2025 - Pepe Envelhecer com Propósito Lidl (Rita Chantre)
Rita Chantre
Portugal está a evoluir, mas é preciso "fazer mais e melhor" para garantir a qualidade dos últimos anos de vida. Mais do que a saúde, os idosos preocupam-se com a quebra nas relações sociais, uma situação que as instituições de solidariedade tentam combater.
"Quando não têm mais ninguém, os idosos contratam a teleassistência da Cruz Vermelha para que alguém ligue todos os dias de manhã, porque querem ter a certeza de que no dia em que não acordarem, alguém vai dar por isso". O retrato de um país envelhecido a lutar contra a solidão é feito por Sónia Fertuzinhos, coordenadora do nacional da teleassistência da Cruz Vermelha Portuguesa, durante o debate "Longevidade Positiva: Construir a Sociedade que Queremos", promovido pelo Jornal de Notícias e TSF, com o apoio do Lidl.
Soluções adaptadas a diversas realidades e o contributo das empresas
Instituições de solidariedade, representantes da sociedade civil e de empresas e especialistas juntaram-se, na tarde de 16 de dezembro, no auditório do Templo da Poesia, no Parque dos Poetas, em Oeiras, para debater os desafios e as oportunidades que a longevidade traz para as sociedades e de que forma o país deve responder ao envelhecimento da população.
Combater o isolamento e o abandono dos idosos foi um dos maiores desafios apontados pelas instituições de solidariedade. "Uma pessoa fechada na sua solidão está a caminhar a grande velocidade para o seu fim, porque é uma enfermidade", defende Rosa Maria Araújo, Presidente da Direção Nacional da Associação Coração Amarelo. Depois de vários anos a trabalhar enquanto assistente social, a acompanhar idosos no dia a dia, Rosa Maria Araújo alerta que "há centenas de idosos a quem a família faz de conta que não existem. Exemplo disso são os hospitais que têm tantos idosos abandonados". Perante esta realidade, a representante da Associação Coração Amarelo pede que a sociedade se organize e lute contra "esta desgraça".
Rosa Maria Araújo reforça ainda a necessidade de tomar conta de quem perdeu a autonomia. "Podemos retirá-los de casa, levá-los a fazerem atividades, eles precisam que alguém lhes mostre que ainda têm valor, apesar de estarem numa cadeira de rodas ou numa cama de hospital", sublinha a representante do Coração Amarelo.
Na perspetiva de Luís Jacob, presidente da Rede de Universidades Seniores (RUTIS) o problema também se pode resolver devolvendo o propósito de vida aos reformados. "Ninguém envelhece bem sozinho. Viver em comunidade e dar uma motivação para as pessoas acordarem de manhã", permite que as pessoas possam viver os últimos anos de vida com mais qualidade. "Aos 65 anos, as pessoas ainda têm muito para dar", acrescenta.
Sónia Fertuzinhos reconhece que tem existido uma falta de "organização de respostas", que deve vir acompanhada pela "diversificação" de soluções "adaptadas à realidade de cada território e comunidade". Uma adaptação que se tem feito também com a ajuda das empresas.
"São muitas vezes o nosso balão de oxigénio", admite Rosa Maria Araújo.
A Cruz Vermelha Portuguesa, a Associação Coração Amarelo e a RUTIS receberam um donativo de mais de 108 mil euros cada, fruto da campanha do Lidl "Cuidar de quem já cuidou de nós vale mesmo a pena". "O bem-estar dos seniores é um tema que tem estado muito presente na nossa agenda. Já apoiámos, em dez anos, cerca de 40 projetos. Além dos donativos para financiar as iniciativas dessas instituições, temos uma grande preocupação com a notoriedade, para que haja um maior conhecimento sobre as soluções existentes", afirma Vanessa Romeu, Diretora de Corporate Affairs do Lidl Portugal.
Combater o isolamento e o abandono dos idosos foi um dos maiores desafios apontados pelas instituições de solidariedade.
Governo promete mudanças
A secretária de Estado da Ação Social e da Inclusão esteve presente no evento, onde aproveitou para reiterar "o compromisso do governo com o bem-estar sénior", reconhecendo que "temos de fazer mais e melhor" para garantir que todos podem envelhecer com qualidade. Clara Marques Mendes lembrou que está a ser criada a estratégia nacional de longevidade. Prometeu modernizar o apoio domiciliário de forma a "articular duas áreas essenciais, a saúde e a segurança social". Clara Marques Mendes refere que a tutela está atenta aos exemplos de instituições de solidariedade que acompanham os idosos diariamente, com várias visitas por dia e que ajudam nas tarefas quotidianas, tendo anunciado que vão arrancar cinco projetos piloto nesse sentido, que envolvem cerca de 150 pessoas. A secretária de Estado da Ação Social afirmou ainda que está a ser preparado o Estatuto da Pessoa Idosa. "Queremos responsabilizar, queremos condensar esses direitos das pessoas num único documento e queremos fomentar o voluntariado sénior", explica.
Longevidade positiva
Constança Paúl, Professora Catedrática no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, da Universidade do Porto, destaca que Portugal tem evoluído muito em termos de longevidade e de qualidade de vida dos mais velhos, mas é preciso melhorar "a esperança de vida saudável", ou seja, o número de anos que alguém vive, a partir dos 65 anos, com saúde. Em Portugal, calcula-se que se viva no máximo oito anos com saúde, após a reforma. "Mas de grosso modo, a grande preocupação das pessoas quando chegam à reforma não é a saúde, são as relações sociais e o acompanhamento", considera Constança Paúl. "Por isso, temos de ter atenção ao propósito de vida e aos fatores que interferem com a qualidade do envelhecimento, mas também temos de olhar para as nossas rotinas e torná-las mais afetuosas".
Já Ana Sepúlveda, CEO da 40+Lab, alertou para as oportunidades de desenvolvimento económico que surgem com o envelhecimento da população. "Ainda há muito a descobrir", afirma, sublinhando que há uma preocupação cada vez maior não só com a hipótese de se viver mais tempo, mas também com a forma como esses últimos anos são vividos e, por isso, começa-se a desenhar soluções para garantir uma melhor qualidade de vida a quem chega à terceira idade. "Nós temos de olhar para o tema da longevidade numa perspectiva de direito e deveres, porque a economia está-nos a trazer esta visão", acrescenta.

