Por mais surpreendente que possa parecer, a capacidade de perceber e de manipular quantidades nasce connosco e deve ser estimulada logo em idade pré-escolar, defende a psicóloga da Educação Joana Rato.
Neste episódio do "Educar Tem Ciência", podcast da Iniciativa Educação em parceria com a TSF e o JN, a professora da Universidade Católica Joana Rato começa por falar de algumas experiências clássicas para demonstrar que "os bebés conseguem identificar o mais e o menos".
E do ponto de vista científico? Haverá uma idade específica para expor as crianças aos números? Joana Rato defende que "não há, de facto, um relógio biológico" para ativar a percepção de quantidade, mas sublinha que "à semelhança do que fazemos com as palavras, as crianças em idade pré-escolar beneficiam e muito quando se tem a oportunidade de trabalhar com quantidades". Ou seja, "é um processo que cresce, sobretudo, com a experiência integrada no dia a dia das crianças, até chegar à compreensão dos números".
O poder de uma orquestra
Há uma diferença entre saber contar e compreender a Matemática, como explica o livro recente "A Arte de Aprender", do neurocientista Stanislas Dehaene. Joana Rato aborda o cérebro como se fosse uma orquestra. "Há uma região, que é a do lobo parietal, que é como se fosse o músico das quantidades, ou seja, a área que nos ajuda a fazer a deteção de quantidades. Mas este "músico' não trabalha sozinho. Vai requerer a parte do lobo frontal, aquilo que temos mesmo por trás da testa e que nos ajuda a planear e a escolher as estratégias", afirma a psicóloga da Educação. "A juntar a isso tudo temos a memória, que nos ajuda a manter os passos para fazer os cálculos. E depois ainda temos as redes ligadas à linguagem e à visão, que nos ajudam a intercetar os símbolos e os números. Por isso, há, de facto, uma rede de várias ligações em termos de áreas cerebrais. Percebemos que, com a experiência e com o tempo, tudo vai ficando ensaiado", acrescenta. "E é aqui que faz toda a diferença podermos trabalhar estas questões logo cedo, para que a adaptação possa ser progressiva para um pensamento matemático mais complexo", sublinha.
É preciso mudar a narrativa à volta da Matemática e encará-la como uma descoberta, afastando a ideia de muitos pais, que por não terem sido bons a Matemática também não esperam que os filhos sejam bem sucedidos nessa disciplina
Os números também contam estórias
O contacto com os números deve ser promovido no pré-escolar, por exemplo, através de cantilenas ou de jogos simples, e também deve ser fomentado em casa, às vezes com coisas simples, como "dividir bolachas, contar os lápis de uma determinada cor ou contar o número de degraus". Joana Rato destaca que é preciso mudar a narrativa à volta da Matemática e encará-la como uma descoberta, afastando a ideia de muitos pais, que por não terem sido bons a Matemática também não esperam que os filhos sejam bem sucedidos nessa disciplina. Esse tipo de discurso causa ansiedade na aprendizagem da Matemática: "Há várias investigações que associam que o simples antecipar de um cálculo ativa áreas associadas à dor. É preciso afastar o medo de errar. É preciso lembrar que, à semelhança do músico, é preciso ensaiar para conseguir bons resultados".
Pode seguir o Educar tem Ciência na rádio ou em tsf.pt, no site da Iniciativa Educação, no canal JN e nas plataformas de podcast.

